Por:

Ambev, quem diria, treme com concorrência

Por Affonso Nunes

A Ambev, subsidiária brasileira da multinacional AB InBev, anunciou no último dia 20 a troca de comando da companhia. O presidente Bernardo Paiva, no cargo desde 2015, será substituído, a partir de 1º de janeiro de 2020, pelo cearense Jean Jereissati Neto, que até então ocupava a diretoria de Vendas e Marketing. A escolha do novo CEO se dá num período conturbado para a líder brasileira no segmento de bebidas (cervejas, bebidas alcoolicas mistas, energéticos, refrigerantes e chás) que opera em 15 países das Américas do Sul e Central, além do Caribe. 

Com produção anual de 141,1 milhões de hectolitros, o Brasil é o terceiro maior produtor de cerveja do mundo, superado apenas por China (381,2 milhões hl) e Estados Estados Unidos (214,6 milhões hl).

A holding AB InBev, presente em mais de 150 países, vê na sua subsidiária brasileira, um papel estratégico pois o Brasil é o segundo maior mercado em vendas do conglomerado, sendo superado apenas pelos Estados Unidos. 

Escolha do novo presidente foi vista pelo mercado como uma aposta da empresa em executivos da casa com a cultura do conglomerado. Jean Jereissati segue o figurino à risca: formado em Administração pela Fundação Getúlio Vargas, ingressou na Ambev em 2000, aos 26 anos, foi diretor de Operações da subsidiária na China e protagoniza uma história de sucesso no segmento das cervejas premium.

- É esperado que a experiência do novo CEO contribua com o momento desafiante da empresa no Brasil, que tem como destaques em relação ao mercado de cerveja a busca de aumento da competitividade em segmentos de baixo custo, que conta com muitas marcas regionais e pulveriza a demanda, e a promoção de forma efetiva do aumento de vendas do seu diverso portfólio premium e artesanal que tem contado com grande crescimento da rival Heineken - observa o engenheiro Felipe Freitas, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ e sócio da Catalisi, uma plataforma de inteligência de negócios para o mercado da cerveja.

Na nota em que anuncia a troca, a Ambev informa que Paiva deixa o cargo “para dedicar-se a projetos pessoais”.

 

É hora de manter a sobriedade num mercado incerto

A Ambev vem aumentando o faturamento nos últimos anos, mas não tem conseguido reduzir custos, afetando a margem de lucro. Tudo porque precisou entrar na guerra de preços iniciada pela concorrência - cenário muito diferente de alguns anos atrás. No terceiro trimestre deste ano, por exemplo, as vendas caíram 2,9%.

- A crise econômica combinada com o momento competitivo do mercado tem mostrado à Ambev uma realidade bastante diferente da década passada, quando seu domínio ocorria de forma menos conturbada. As condições de mercado recentes esvaziaram o crescimento das marcas do seu portfólio intermediário (Brahma, Skol e Antarctica), justamente onde a empresa demonstrava sua maior força – diz Felipe Freitas.

Mesmo líder do mercado, a Ambev se vê ameaçada em duas frentes, na base e no topo da pirâmide. Devido à recessão, parte dos consumidores de menor poder aquisitivo passou a buscar marcas de menor custo em relação aos rótulos tradicionais do grupo. Na outra ponta, de maior poder aquisitivo, opções de maior valor agregado passaram a ser consideradas.

Exemplo disso é ofensiva da Heineken, que investiu pesado no Brasil ao adquirir o portfólio Brasil Kirin (Schincariol, Devassa, Baden Baden e Eisenbahn) e alavancou o grupo holandês a abocanhar 20% do mercado nacional. Há um mês, a multinacional holandesa confirmou que o Brasil se tornou o maior mercado consumidor da cerveja da garrafa verde no mundo e, de quebra, anunciou investimentos na ordem de R$ 1 bilhão para aumentar a capacidade produtiva de suas fábricas no país.

De acordo com Érica Barbosa, fundadora da Marketing Cervejeiro, os holandeses levam vantagem neste momento porque seu posicionamento de marca é mais sólido.

- Historicamente, a Heineken firmou parcerias na cultura, em grandes eventos esportivos como a Champions League e a Fórmula 1 enquanto a Ambev direcionava volumosos recursos para uma publicidade que mostrava mulheres de biquíni servindo homens - aponta. Feito o diagnóstico, a Ambev trabalha no tratamento. Para promover avanços dentro das novas dinâmicas do mercado, o grupo tratou de reforçar a variedade de opções do portfólio, adquirindo pequenas cervejarias do segmento artesanal, e adotou mudanças em vários aspectos organizacionais, que tendem a ser aprofundadas na gestão de Jereissati.

- O mercado não comporta mais a guerra de preços. A tendência agora é acompanhar a mudança de comportamento do consumidor, que demosnstra maior interesse por rótulos artesanais, o que é um caminho sem volta - destaca Érica, que vê os investimentos ambevianos na introdução de embalagens ecológicas como um ativo interessante no reposicionamento da marca.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.