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Recuperar o Galeão: Solução muito além de uma “canetada”

Por Daniel R.Carneiro*

Outrora principal porta de entrada do Brasil, o Aeroporto Internacional do RJ, Galeão, passa hoje por sua maior crise, perdendo, em passageiros, pousos e decolagens, posições para outros que até pouco tempo vencia, como Brasília, Confins e Recife, com Salvador e Porto Alegre já em sua cola. A inauguração de Guarulhos em 1985, o fim da restrição da operação de voos domésticos com jatos no Santos Dumont, em 2009, a violência no Rio de Janeiro e dificuldades de acesso, além das altas taxas praticadas pela concessionária – fonte de reclamações de empresas aéreas e prestadoras de serviços que lá operam – contribuíram significativamente para que o Galeão se transformasse em um “aeroporto fantasma”.

Autoridades movimentam-se para limitar as operações no Santos Dumont tentando devolver voos ao Galeão, mas fazer isto sem tornar, antes, o AIRJ atraente para passageiros e aéreas, poderá fazer com que o Rio perca ainda mais voos, e fortaleça hubs como Guarulhos, Viracopos, Confins e Brasília.

O Santos Dumont tornou-se querido pelos cariocas graças a a sua localização privilegiada, próxima ao Centro e à Zona Sul, e com a inauguração do VLT tornou-se ainda mais atraente, sendo diretamente ligado por transporte público rápido e seguro à Rodoviária Novo Rio, ao Metrô e ao Pier Mauá. O Galeão, por sua vez, viu suas duas poucas e precárias opções degradarem-se: a integração Metrô-BRT, inaugurada para a Copa de 2014, é lenta e ineficaz para passageiros que queiram chegar rápido ao aeroporto, e as linhas de ônibus especiais que o ligavam ao Centro, Santos Dumont e Zona Sul, que já vinham tendo frequências reduzidas, deixaram de operar logo após o início da pandemia. Os constantes congestionamentos, arrastões e tiroteios na Linha Vermelha também figuram entre os motivos que levam o passageiro a preferir o Santos Dumont. Fica claro, então, que transferir voos de um aeroporto para outro sem tratar estas questões e limitar o SDU à ponte-aérea poderá ser um “tiro pela culatra”, levando as companhias a reduzirem a oferta de destinos a partir do Rio e a optarem por conexões em outros hubs nacionais.

Como devolver ao Galeão o título de principal aeroporto do RJ? Primeiramente, investindo-se na ligação ao Centro e a outros modais por um transporte público rápido, seguro e eficiente como o Metrô, solução empregada outras grandes cidades pelo mundo, ou por barcos de alta velocidade (como proposto por Claudio Magnavita em sua gestão como secretário de Turismo do RJ, à época da Copa de 2014). É preciso, também, que se encare o problema da violência e ocupação desordenada do entorno da Linha Vermelha e Avenida Brasil sem demagogia, mantendo policiamento ostensivo, protegendo a via de invasões por ambulantes e criminosos, e urbanizando os limites das comunidades vizinhas como forma de impedir novas construções.

O governo do estado tenta minimizar o esvaziamento do Galeão reduzindo o ICMS sobre o combustível aeronáutico para operações no aeroporto, mas isto está longe de ser suficiente. Há que se trabalhar para que a concessionária pratique tarifas e aluguéis mais atrativos tanto para as companhias aéreas como para outras empresas que têm negócios no aeroporto. E ainda, promover a revitalização do Terminal 1, hoje abandonado, convidando as companhias aéreas nacionais a que uma delas utilize o T1 utilização como seu hub e oferecendo incentivos como a redução de taxas para que invista na reforma do terminal. Seria interessante, ainda, explorar a vocação do T1 como atração turística que era nos anos 70 e 80, recriando seu terraço panorâmico que tantos visitantes atraía ao aeroporto e criando, lá, um centro comercial, cultural e gastronômico. Por último, deve-se também trabalhar junto à BRAZTOA, ABAV e Conventions Bureaux para incentivem as aéreas a criar mais frequências de e para o Galeão, oferecendo, em contrapartida, ações que contribuam para que mais turistas utilizem o aeroporto. Entre estas, estimular as companhias marítimas que operam cruzeiros no Brasil a concentrar no Rio o embarque de passageiros de fora de SP, ressaltando a vantagem da menor distância entre o Pier Mauá e os aeroportos cariocas em relação à que separa Santos dos aeroportos paulistas.

Além disso, é preciso fortalecer a Área Industrial do Galeão, incentivando indústrias do ramo aeronáutico e empresas de manutenção a se instalarem no complexo aeroportuário. A TAP M&E, que hoje no Galeão ocupa um dos maiores hangares da América Latina, anunciou a intenção de se desfazer de sua unidade de manutenção no Brasil. Seu fechamento resultará na perda de receitas e de vagas para trabalhadores qualificados, o que faz da Área Industrial do Galeão assunto obrigatório e prioritário da pauta da diversas Secretarias de Estado.
Uma vez tratadas todas essas questões, pode-se então discutir a redistribuição de voos entre os dois principais aeroportos cariocas. O Santos Dumont, com sua vocação de business, poderá concentrar voos com aeronaves do porte máximo do Airbus A319 ou Boeing 737-700 para aeroportos de importância econômica do Sudeste (como Congonhas, Pampulha, Campinas, São José dos Campos, Ribeirão Preto, Macaé e Campos), Brasília e destinos regionais e turísticos a curta distância (Cabo Frio, Búzios, Angra dos Reis, Paraty, Vale do Paraíba, Juiz de Fora, Vitória etc). O Galeão, por sua vez, merece voltar a ser um dos principais portões de entrada do Brasil, o que só será possível quando esse aeroporto puder voltar a oferecer uma rede rica em conexões para outros Estados do país e vizinhos sul-americanos e tornar viável a vinda de mais voos internacionais para a capital fluminense.

 

*Daniel R. Carneiro é analista de sistemas, servidor público estadual (lotado no PRODERJ e tendo atuado como assessor nas secretarias de Turismo, Comunicação e Planejamento do Estado, além de ter feito parte, como membro-convidado, do Grupo de Apoio e Fomento ao Turismo Marítimo e Náutico), jornalista e fotógrafo especializado em aviação e turismo.

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