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Boeing diz que crise do 737 MAX não afetará acordo com a Embraer

Por Igor Gielow (Folhapress)

A gigante aeroespacial americana Boeing vive hoje uma crise "sem precedentes" devido aos problemas de seu modelo 737 MAX, mas o impacto dela não afetará a conclusão da negociação do acordo com a brasileira Embraer.

A avaliação é de Darren Hulst, diretor sênior de análise de mercado e suporte de vendas da Boeing. Em conversa com a reportagem, em São Paulo, ele buscou mostrar otimismo em relação ao caso do MAX.

O modelo é um dos mais bem-sucedidos lançamentos da história da aviação comercial, com mais de 5.000 pedidos e 350 entregas até o começo do ano. Foi quando tudo mudou, após a segunda queda de um avião do tipo, no caso da série 8, em cinco meses.

Investigações ainda em curso mostraram que um sistema automático de correção do ângulo de voo da aeronave provavelmente provocou as duas tragédias, que mataram 346 pessoas. O motivo, um software falho e falta de treinamento adequado de pilotos à situação em que a máquina entrava em ação. Somaram-se a isso acusações de negligência de diversas ordens, todas negadas.

Com isso, em março toda a frota mundial foi deixada no solo. A Boeing crê que terá liberação em janeiro de 2020, mas no mercado ninguém mais arrisca saber o destino do avião –até aqui, menos de 100 compras foram afetadas. No Brasil, a Gol operava 7 dos 135 MAX que encomendou, 30 dos quais do novo modelo, a série 10.

"Mantemos a confiança no MAX e em seu potencial. Na América Latina, 89% da demanda por aviões nas próximas duas décadas será por modelos de um corredor, como ele", disse Hulst, para quem o "impacto inicial" da crise não afetará eventuais investimentos no novo negócio no Brasil.

A reportagem conversou com executivos envolvidos na negociação entre Boeing e Embraer, sob reserva, e eles tendem a concordar com a avaliação de Hulst. Hoje o maior problema do acordo é passar por autoridades regulatórias europeias.

Num primeiro momento, não há necessidade de injeção maciça de capital além do que desembolso inicial: a Boeing acertou a compra de 80% do controle da área de aviação comercial da Embraer por US$ 4,2 bilhões (R$ 16,8 bilhões), mas é uma linha diversificada e pronta.

Assim, no curto prazo, os principais gastos seriam o desembolso em si pela fatia mais rentável da empresa brasileira e eventuais reposições de maquinário ou atualizações tecnológicas mais básicas. E a Boeing tem um faturamento na casa dos US$ 100 bilhões (R$ 400 bilhões) anuais.

Naturalmente, para tal avaliação valer é preciso que a Boeing consiga colocar novamente os MAX no ar. A crise já custou cerca de US$ 10 bilhões (R$ 40 bilhões), fora a depreciação de mercado.

O Brasil domina o mercado aéreo da região, com 40% do volume da América Latina. "Se crescer a 4% ou 5% ao ano, como prevemos, em 2020 já deverá ultrapassar o Japão e virar o quinto maior do mundo", diz Hulst. O ranking hoje tem EUA, China, Índia e Rússia à frente.

Nas previsões da Boeing, a demandas pelo produto primário adquirido na compra da Embraer comercial é baixa na América Latina: apenas 30 novos aviões regionais. Os grandes mercados são a Ásia e os EUA.

O Brasil tem também cerca de um quarto da frota atual de aviões, 1.590 unidades. Hulst prevê a adição de mais 2.690 aeronaves até 2038, mais que dobrando o total: 3.380 modelos no ar, entre antigos e novos. Será um mercado estimado em US$ 500 bilhões (R$ 2 trilhões).

A crise econômica tem efeitos, claro: o Brasil só em 2018 voltou ao nível de 2015 de passageiros, 118 milhões. Mas Hulst vê no aumento da classe média com acesso aeroportos o grande motor que puxa o crescimento do setor. "Na última década, foram 40 milhões de famílias a mais na classe média regional", diz.

Ele afirma que o crescimento previsto para os próximos 20 anos é de nove vezes entre empresas consideradas de baixo custo, o que Hulst concorda que não é uma realidade precisa por aqui, por englobar a virtual duopolista Gol, por exemplo, e 1,3 vezes no mercado das empresas ditas de rede.

A dominância hoje no mercado de aviões de um corredor na América Latina é do grande rival do 737, o Airbus A320 –no Brasil, operado pela Latam, enquanto a Gol vai Boeing e a Azul, de modelos regionais da Embraer no segmento.

A Boeing, criadora do conceito de avião gigante com o 747 há 50 anos, mantém a liderança nos chamados "widebodies": 63% do mercado, mais 68% das encomendas. Na América Latina, a demanda é pequena até 2038, de 270 aviões, ante 8.300 no mundo todo.

Mas seu principal produto no setor, o 777-X, está em apuros. Não tão sérios quanto os do MAX, claro, mas ainda assim preocupantes para a empresa: seu lançamento já foi adiado de 2020 para 2021, devido principalmente a um problema com a turbina do modelo bimotor. "Iremos superar, e o 777-X será o novo 747, só que muito mais eficiente", diz Hulst.

Economia de combustível é tudo nesse mercado, já que talvez 60% do custo de um voo seja seu querosene. Do ponto de vista ecológico, redução de emissões de carbono com motores mais eficazes é o mote, e o mercado cortou 70% do que emitia de poluentes no começo da era do jato, nos anos 1960.

Assim, o vetusto 747 segue com futuro apenas na sua encarnação como avião de carga, e o ultramoderno Airbus A380 foi tirado de linha pela fabricante europeia. Em comum entre os dois aviões, o uso de quatro turbinas.

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