Coluna Magnavita: Antes de deixar Esportes, Gutemberg Fonseca pagou R$ 19 milhões a FairPlay

O amigo Bomba - Parte I

Compreenda a trajetória tumultuada de Gutemberg Fonseca e a sua forma de agir 

Por Cláudio Magnavita

Quando foi realizado o Rio Open de Tênis, em fevereiro passado, um fato chamou atenção: uma mancha branca na plateia. O principal torneio de tênis do Brasil, com lugares disputados a tapa pelos aficionados da raquete, tinham dezenas de cadeiras vazias nas partidas. Eram os convites enviados para a Secretaria de Estado, e que ficaram retidos com o secretário Gutemberg de Paula Fonseca. Para o gabinete do governador, enviou doze pares de ingressos. No Guanabara, chovia pedidos de tickets, que estavam retidos na “república dos esportes”, território independente do governo estadual, que sempre tratou com rebeldia às instâncias superiores.

Este relacionamento tumultuado no governo estadual reeditou o mesmo comportamento de Fonseca com o Governo de Wilson Witzel, que o nomeou como Secretário de Governo, instalando a sua estrutura na entrada do prédio histórico do Guanabara.

Em uma sala com infiltração no teto e placas de gesso penduradas, Gutemberg começou a acumular inimizades. Deputados tomavam intermináveis chá de espera. Promessas não eram atendidas e pedidos esdrúxulos eram enviados, como o ofício que pedia 800 ingressos de cortesia, a título de “atender aos deputados”, o que gerou um telefonema de protesto de Rubem Medina, diretor da Artplan, para o então secretário da Casa Civil, José Luiz Zamith.

Na agenda de Fonseca, entrou PROCON, Maracanã e Barreira Fiscal. As queixas contra o jeito truculento do ex-juiz de futebol foram se acumulando, até que Witzel resolveu dar um basta. Em uma reunião no gabinete principal do governador, na presença do vice Cláudio Castro e de mais dois secretários, Gutemberg Fonseca foi chamado e comunicado o seu desligamento. Além de queixas, Witzel falava de acusações, nunca comprovadas, que acelerou a saída do seu marqueteiro de 2018, que, entre as proezas, conseguiu grudar a imagem do candidato do PSC a Flávio Bolsonaro, postulante ao Senado, fazendo WW surfar na onda bolsonarista, mas sempre como penetra.

Fora do Governo, ele passou a creditar sua demissão ao conflito de interesses de Witzel e Bolsonaro. 

 

Nunca foi nomeado no Governo Federal

Defenestrado do Estado, nunca conseguiu uma vaga no Governo Federal. Passou a se apresentar como melhor amigo do senador eleito, arrotando uma ascendência sobre o parlamentar e fazendo questão de dizer que Flávio tinha uma suíte na sua casa, em um condomínio da Barra. Alegava também que, em Brasília, se hospedava no apartamento funcional do senador. Dois fatos nunca comprovados e que viraram lenda.

Gutemberg Fonseca fez parte de um núcleo inicial, que apostou na campanha do deputado federal, a quem faz questão de se referir sempre como “Jair”. Ele esteve à frente, realmente, de algumas ações, como o lançamento de um livro que humaniza o mito, que, aliás, ele pensa em relançar.

Algum porém aconteceu e Gutemberg, que sempre tem passagem meteórica por onde passa, foi afastado. Até hoje, a sua relação com Carlos e Eduardo Bolsonaro é de distância. Neste lado da família, ele é visto como o amigo problemático do 01. Um tratamento quase folclórico.

De fato, ele não teve mais espaço com o encordoamento da campanha presidencial, parando no PSC de Everaldo Pereira e cuidando da campanha do desconhecido ex-juiz. Foi a sua malandragem de usar a agenda de Flávio que turbinou Witzel e gerou, em 2019, mais inimigo da família Bolsonaro.

 

Sempre em movimento

Sem criar limo por onde passa, ele se aproximou de Marcelo Crivella e acabou propondo ser o interlocutor com Brasília. Ganhou a secretaria de Ordem Pública e virou o xerife da cidade. Pulou para os holofotes. Ao lado de Crivella, usou a mesma estratégia do candidato Witzel, de forma reversa. Usava o prefeito e líder do Republicanos para aumentar a pequena fresta que ainda tinha no acesso ao presidente. Fez isso também ao balançar a cenoura do Patriota, levando Adilson Barros para algumas conversas com o “Jair”. Precisou de muletas para receber a atenção presidencial, já que sempre tiveram um pé atrás com o amigo do Flávio.

O Patriota naufragou e nenhuma das promessas de um partido pacificado vingou. Já Crivella e Marcos Pereira abriram o Republicanos como a ponte do Aliança Brasil.

Como marqueteiro de Crivella e podendo finalmente usar a imagem do presidente, ele recebeu a missão de cuidar da campanha de Rogeria Bolsonaro, a mãe do 01,02 e 03, a vereadora do Rio. Não se empenhou e não cumpriu nada do que prometeu, fazendo a primeira Bolsonaro a ter pífios 2 mil votos. Episódio que abalou, momentaneamente, a amizade com o Zero Um, que ficou semanas sem falar com Gutemberg, que pulou como siri na lata.

A sua gratidão com Crivella foi extraordinária. Processou, na pessoa física, o prefeito, que lhe ressuscitou na gestão pública, por dívida de campanha. Usou como advogado Alessandro Carracena, que também o sucedeu como secretário. Criou um fato inédito na política: dois ex-secretários processando quem os nomeou.

Além da gratidão política, ele deveria ter agradecimento aos negócios. Apesar de ser da Ordem Pública, comandou, informalmente, a publicidade da prefeitura, promovendo a licitação das agências da qual saiu de uma empresa de Brasília, de onde veio. Para isso, atropelou o subsecretário de comunicação, Daniel Pereira, que, literalmente, foi aos tapas com Fonseca na Cidade das Artes .

Na planície, resolveu se reinventar como comentarista de arbitragem da Rede Record e, mordido pela mosca azul, resolveu ser o candidato a deputado federal da família Bolsonaro. Voltou à ribalta como secretário de Estado de Esportes do Governo Cláudio Castro, que, aliás, assistiu e soube dos reais motivos da sua exoneração em 2019.

 

De volta ao Estado

Fonseca falava cobras e lagartos do governador, usando adjetivos impublicáveis. Mirou a cadeira de Leandro Alves, o Peixe, e infernizou a vida de Flávio Bolsonaro até conseguir a indicação. Recebeu apenas um conselho do senador “veja bem o que vai fazer”. Este aviso de cautela deve ter sido esquecido e, em poucos meses, a pasta se transformou em um lodaçal de acusações na mídia e, agora, investigadas pelo Ministério Público.

Antes de se desincompatibilizar para concorrer a deputado federal, ordenou o pagamento de R$ 19.075.648,00 para o Instituto FairPlay – CNPJ 10.489.688/0001-79 –, referente a primeira parcela do milionário projeto ERREJOTA em Movimento, que, a exemplo dos convites do Rio Open, reservou todos os 500 núcleos da primeira fase exclusivamente para a sua campanha de deputado federal.

O seu escritório eleitoral, como anuncia aos quatro cantos, é, realmente, em salas cedidas em comodato pelo desembargador Luiz Zveiter. Se o Ministério Público ou a Justiça Eleitoral pedir as imagens de vídeo da portaria, assistirá à entrada de vários nomeados na secretaria e que passaram a permanecer no novo endereço.

Membro de uma respeitada loja maçônica, Fonseca costuma se apresentar como o dirigente de relações institucionais do Grande Oriente do Brasil, fato que tem causado dissabores a Zveiter e a outros maçons que não admitem o uso da ordem além das colunas.

Neste lamaçal dos esportes, a crise mais recente foi forçar Flávio Bolsonaro a se envolver no seu capricho de mudar, abruptamente, o comando da secretaria, já que o gestor escolhido por ele, mesmo com o aval do senador, estava tentando moralizar a pasta e acabar com as irregularidades encontradas.

Conseguiu, em rito sumário, que fosse exonerado quem tentava consertar os seus erros e nomeou quem dá abrigo ao seu jeito informal de tratar a coisa pública. Agiu com de forma ardilosa, já que não teve a decência de ligar para o secretário e informar que ele estaria sendo exonerado. Com um agravante:  além de amigo de família, o secretário exonerado é chefe de família, honesto, militar e também seu irmão de maçonaria.

 

Continua na próxima edição: Um Raio X da ERREJOTA em Movimento