Coluna Magnavita: Pecado em dose dupla

Secretário de Witzel é indicado por entidade privada e vai acumular função no Governo Federal

Por Cláudio Magnavita*

Poucos dias depois de a Confederação Nacional do Comércio (CNC) detonar as fontes de recursos da nova Embratur, peitando o governo e a área econômica e impondo ao governo uma derrota por 10 votos no artigo que destina 4% dos recursos do Sesc/Senac para a nova agência de promoção turística, a entidade consegue emplacar o braço direito do governador Wilson Witzel, o secretário de Desenvolvimento Econômico do Rio e ex-sócio do governador, Lucas Tristão Carmo, como vice-presidente da Primeira Turma Extraordinária da Terceira Secção de Julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), do Ministério da Economia.

O ato foi publicado no Diário Oficial da União, nesta segunda-feira (4), por meio da portaria 10.905 de 29 de abril de 2020 (foto) e é assinado pelo secretário executivo do Ministério da Economia, Marcelo Guaranys.

A coluna apurou que a vinculação do nomeado com o governador Witzel passou despercebida. Tratava-se de um expediente de rotina, já que Lucas Tristão, depois de duas tentativas frustradas, conseguiu ingressar no Carf em 19 de março de 2020, novamente indicado pela Confederação Nacional do Comércio, na qualidade de suplente, conforme ofício de indicação assinado pelo novo presidente José Roberto Tadros e não mais pelo conterrâneo capixaba de Lucas, Antônio Oliveira Santos, ex-presidente da CNC e responsável pelas duas indicações anteriores frustradas.

O que causa surpresa é ver um conselheiro suplente ser nomeado vice-presidente da turma, já que a função estaria reservada somente para conselheiros titulares.

Há exatamente dois meses, o Correio da Manhã mostrou que havia uma relação entre uma firma de advocacia especializada em direito tributário, que ainda tem Tristão como sócio gerente, e um sócio que era conselheiro do Carf. Praticavam advocacia tributária mesmo tendo um sócio no conselho que julga recursos dos contribuintes. Esta articulação durou até que o mandato do sócio venceu e o próprio Tristão tentou entrar por duas vezes em lista tríplice da Confederação Nacional do Comércio (CNC), sendo preterido pela análise de currículos de candidatos mais experientes.

Este era seu negócio principal até se aproximar do seu professor Wilson Witzel, de ter trabalhado na campanha e virado secretário de Estado. Como o Correio demonstrou, contrariando a legislação, Tristão continuava como sócio administrador da firma, o que é proibido por lei e, apesar de ter afirmado na reportagem publicada em 7 de fevereiro, que estaria alterando a constituição, ela até hoje não ocorreu, e na pesquisa realizada na noite do dia 4 de maio ele ainda figura como titular da gerência da empresa.

Sobre o Carf, ele afirmou que não se lembrava das indicações anteriores realizados pela CNC, só que os documentos apurados pela coluna demonstram que, ao mesmo tempo em que tinha crise de amnésia, já tramitava uma nova indicação assinada pelo presidente Tadros e emplacou, transformando-se no ato do dia 4 em vice-presidente de uma das Câmaras.

O caso merece ser apurado com rigor pelo Procurador Geral de Justiça do Estado, já que Tristão, ao ser designado em lista tríplice da CNC, aceita favores de uma entidade privada, que o ajuda a realizar um velho sonho e turbinar a sua empresa de advocacia, na qual - segundo a Receita Federal - continua como sócio administrador, o que é proibido por lei.

A ida do Tristão para o Carf e a sua nomeação como vice-presidente demonstra que a sua agenda original de negócios continua em curso, o que aumenta as especulações sobre a sua atuação em indicações de pessoais da sua confiança para os setores de maior movimentação financeira no Estado. É notória também a sua ligação com o empresário Mario Peixoto, para o qual chegou a advogar.

A nomeação feita pelo Ministério da Economia do braço direito do governador pegou de surpresa todos em Brasília, principalmente por ocorrer em um período no qual o distanciamento do governador do Presidente da República, Jair Bolsonaro, atinge o seu ápice, a exemplo do longo artigo publicado pelo chefe do executivo carioca, publicado sábado passado no jornal O Globo. O sócio de Tristão CARLOS AUGUSTO DE ANDRADE JENIER, também atua na área federal, sendo um dos consultores jurídicos da Caixa Econômica Federal.

Receber favores da CNC, entrar para o Carf, turbinando o seu escritório de advocacia, do qual se mantém como gestor, tudo de forma documentada, cria uma situação de embaraçosa para o secretário estadual Lucas Tristão do Carmo, além de problemas legais que precisam ser esclarecidos.

*Cláudio Magnavita é diretor de Redação do Correio da Manhã