Coluna Magnavita: Witzel assinou a própria sentença de morte política

Assinatura do próprio punho e rubricas do governador não deixam dúvidas sobre a sua responsabilidade direta na reabilitação da OS, Unir Saúde, ligada a Mário Peixoto

Por Cláudio Magnavita*

Quando o servidor Pedro Paulo Gomes, gerente de protocolo da Secretaria de Estado de Saúde - SES, ID 6175538 – assinou, no dia 13 de março de 2019, o processo físico 08/001/1170/2019, atendendo o pedido de abertura de processo administrativo, realizada pelo ofício 269/2019, assinado por Wanderley da Cruz Amaral, subsecretario de Controle Interno e Compliance da SES, ID 2561116-0, não imaginou que um ano depois, em 23 de março de 2020 e 375 folhas depois do termo de abertura, estaria a autoridade maior do estado, se transformando no “Zero Um” do governo, colocando a sua assinatura e incorrendo na suspeita concreta do crime de responsabilidade, que pode lhe custar o mandato.

Esta peça histórica, enviada a comissão de Saúde e Covid-19 da Assembleia Legislativa do Estado, representa a maior prova da atuação direta do governador Wilson Witzel em uma operação que envolve todos os personagens da operação “Favorito” do MP Estadual e da “Placebo”, da MP Federal.

Não há dúvidas. O processo não foi assinado por token eletrônico. Foi o próprio governador que colou a sua assinatura, a mesma imortalizada pelas suas propagandas em redes sociais.
São sete páginas, todas devidamente rubricadas pelo próprio WW. Na última ele afirma: “Assim, pelo exposto, com base em juízo de conveniência e oportunidade, com fundamento na súmula 473 do STF e em atenção ao princípio da proporcionalidade, dou provimento ao recurso e determino a REVOGAÇÃO da portaria SES/SECCG n° 664, de 16 de outubro de 2019.
A presente decisão somente produzira efeitos após a sua publicação.

Rio de Janeiro, 23 de março de 2020

Wilson Witzel”

A data foi complementada com o dia e o mês escrito a caneta, mostrando que o documento já tinha sido preparado anteriormente. Na página nº 375 do processo, há ainda um carimbo da Casa Civil indicando a sua publicação no dia 24 de março de 2020, no Diário Oficial do Estado, que ocorreu no formato de súmula resumida. Tratando-se apenas da revogação pelo governador de uma resolução conjunta de duas importantes secretarias: a da Saúde e da Casa Civil.

O processo encerra na página nº 377, com o encaminhamento pela chefe de Gabinete da Secretaria da Saúde, Elaine Lucio Pereira, ID 2527014-1, para a presidente da Comissão de Qualificação – Resolução Conjunta SECCG/SES n°56/2019, Maria Juliana Studart Leal, com o seguinte teor: “Trata-se de recurso hierárquico apresentado pelo INSTITUTO UNIR SAÚDE- UNIR, em face da decisão proferida no presente processo administrativo que decidiu pela desqualificação da Organização Social no âmbito do Estado do Rio de Janeiro.

Considerando a publicação no D.O. de 24/03/2020 da revogação da Portaria SES/SECCG n° 664, de 16/10/2019, conforme fls 375, encaminhamos para ciência e adoção de providências que julgar pertinentes.
Rio de Janeiro, 30 de março de 2020

Elaine Lucio Pereira

Chefe de Gabinete”

Ao contrário do Pedro Paulo, o gerente de Protocolo da SES, a servidora Elaine Lucio Pereira já tinha a noção do resultado explosivo desta decisão. Já começa a SES entrar no olho do furacão da pandemia e a atrair atenção pelas contratações exageradas, a partir da decretação do Estado de Calamidade Pública 13 dias antes pelo próprio governador.

O peso da decisão

O MP Estadual considerou a UNIR Saúde uma Organização Social ligada a Mario Peixoto e sucessora da DATA RIO. Nas conversas gravadas na operação, capturadas com autorização judicial, Luiz Roberto Martins Soares informava a um interlocutor, de nome Elcy, que “o ex-deputado Nelson Bornier confirmou que o “Zero Um” teria concordado em reabilitar a OS”, fato que ocorreu dias depois assinado pelo “Zero Um” do Estado, o governador Wilson Witzel.

O curioso é que no seu argumento Witzel utiliza o critério da PROPORCIONALIDADE, o mesmo termo que utiliza agora no seu embate com a Alerj.

A reunião final para reabilitar a UNIR ocorreu na presença do advogado Antonio Vanderler de Lima, que possui vínculos com a UNIR pela ligação contratual do seu filho e homônimo com a Organização Social, e do Secretário da Casa Civil, André Moura. A recusa de Moura de cancelar uma decisão foi alegar que, por ser uma resolução conjunta entre duas pastas (Saúde e Casa Civil), não poderia ser revogada apenas por um. O clima com Edmar Santos já estava azedo e ele não concordaria em assinar uma revogação baseada em critérios técnicos, com pareceres de procuradores do estado e sem nenhuma fundamentação. A UNIR já havia recebido R$ 180 milhões do governo e, mesmo desqualificada, continuava a receber valores atrasados e a prestar serviços.

Neste documento fica clara a atuação direta do governador, e a sua assinatura no processo físico não deixa dúvidas da sua responsabilidade direta.

A grande ironia é que, neste caso, é o próprio Witzel que contraria o seu então secretário de Saúde, “vilanizado” após a deleção. Neste caso, Edmar e Moura acataram os dois volumes e a farta documentação juntada nas quase 400 páginas do processo. As únicas passagens favoráveis a organização são as manifestações da própria OS e o parecer do governador, que anula a portaria dos seus dois secretários.

Além dos vínculos de Mario Peixoto, ter o diretor da UNIR e ex-diretor da DATA RIO como seu terceiro maior doador de campanha cria laços indissolúveis entre a organização e o governador, também de forma explícita.

Dias depois do escândalo estourar na mídia, o Governo do Estado voltou atrás e desqualificou novamente a Organização Social. Este ato, na prática, anulou todos os argumentos do “Zero Um” do estado para reabilitar a OS. Para a Alerj, esta assinatura representa a base mais sólida para o processo de impeachment, que aguardava a decisão do STF sobre o rito a ser adotado.

*Cláudio Magnavita é diretor de redação do Correio da Manhã.