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Black Sabbath: 50 anos de metal pesado

Por João Victor Ferreira

O ano era 1970. O rock and roll, originário da década de 1950, seguia seu curso natural de evolução, das pedras que rolam como já havia definido o bardo Bob Dylan em “Like a rolling stone”. A juventude se deixara levar pelos requebrados de Elvis Presley, pela revolução do iêiêiê dos Beatles e até se desmanchou nas viagens lisérgicas de Woodstock. E quando a cena roqueira parecia seguir um curso relativamente previsível, quatro garotos pobres, de origem operária, da cidade de Birmingham, multiplicaram em peso o que já se podia ouvir no icônico “White álbum” (1968). Se canções como “Revolution” e “Helter skelter” acenderam a faísca, não se pode negar que o heavy metal, um gênero cultuado por multidões, nasce com o Black Sabbath.

Até o fim dos anos 1960, o rock só conhecia a evolução musical dos Beatles e de seus concorrentes de acordes mais intensos: os Rolling Stones. Como banda e referência para a música, os Beatles de fato alinharam muito conceitos para a construção de estilos que viriam logo em seguida, uma vez que dentro da sua própria discografia há mudanças de “pegadas” que vieram a calhar anos depois. Começando em uma sexta -feira 13 de 1970 - mais precisamente 13 de fevereiro -, aquele álbum de capa em tom sépia com uma bruxa iria repercutir muito além dos becos de Birmingham para influenciar o rock pelas décadas seguintes. Ou alguém discorda que o Black Sabbath é o pai, mãe e espírito santo (e até mesmo o diabo) para bandas hoje antológicas do heavy metal como Iron Maide, Motorhead, Metallica, Judas Priest e Slayer?

Em entrevista no documentário “God bless Ozzy” (2011), o próprio Paul McCartney fala da estranheza e força que sentiu ao ouvir pela primeira vez o álbum de estreia da banda, com sua atmosfera sombria, macabra e, acima de tudo, pesada. Baseado em um pesadelo descrito pelo baixista Geezer Butler e co-escrita por Ozzy Osbourne, a faixa inicial, que também leva o nome de “Black Sabbath”, é uma ode ao fúnebre, ao sombrio, algo que fazia muito sentido para quem vivia em Birmingham. Abalado depois da Segunda Guerra, o distrito industrial de metalurgia da Inglaterra, nos anos 1960, emanava pobreza e miséria para a maioria da sua população proletária.

Esse foi o caminho que maioria dos membros da banda percorria - o guitarrista Tony Iommi chegou a perder a ponta de suas duas falanges em um acidente de fábrica. Ozzy não passava de um pária social, que já havia garantido, na época, a sua ida à prisão por não se encaixar nos padrões tradicionais da sua escola e da sociedade como um todo. Unidos por um amplificador - isso mesmo, Ozzy só ingressa na banda pelo fato de ser o único integrante que tinha um amplificador Marshall em sua casa -, os quatro se reúnem com o objetivo de exaltar o niilismo que as suas vidas conheceram, decidindo criar um estilo que exalta e alude muito mais o sentimento de desesperança e horror do imaginário coletivo da época, mais do que um simples escapismo de fingir que nada estava acontecendo ao redor.

Da mesma forma que o movimento literário e cinematográfico (em suas épocas diferentes) do horror se preocupava em demonstrar as raízes moralistas da natureza humana, decidindo não mais negar os horrores da realidade com metáforas que fossem analogias para o mundo real, Black Sabbath aposta nessa espécie de terror musical que conceitualmente gerou toda a temática por trás da banda. “O que é isso que se levanta a minha frente?/ Um vulto preto que aponta para mim/ Viro rapidamente, e começo a correr/ Descobri que eu sou o escolhido// Oh não!”, avisa a banda em sua faixa-título

Mas e musicalmente, o que vem de novo? Black Sabbath foi uma banda de extrema importância para a música, não só por ser pioneira no seu eixo temático, mas nas suas composições que serviriam de padrão para toda a gama de divisões e subdivisões do que mais tarde viria a ser chamado de heavy metal. Tommy Iommi foi um dos grandes responsáveis nesse novo paradigma que, munido de dedais em sua mão direita, criou riffs antológicos para a música, a exemplos como “Paranoid”, “Iron man” e “War pigs”.

Esse som mais sujo, violento e imponente fez muito sucesso com a juventude da época, de modo que Tommy se aproveitava muito das inversões que propunha dentro da própria música, além das pausas no compasso entre um riff e outro. O foco do guitarrista nunca foi o virtuosismo de notas e escalas executadas de forma rápida e técnica. A música quase soa como uma voz sedutora e ao mesmo tempo macabra, como se a guitarra falasse no seu ouvido lenta e calmamente.

A guitarra distorcida também era uma marca do músico, passando a neurose e paranóia por trás de um som metálico e dissonante, como em “Electric funeral”. A linha rítmica do baixo de Geezer Butler traz todo um contexto referencial do jazz para uma banda de rock, apostando na força do instrumento que dá vida e pulsação às composições da banda, sendo extremamente potente e preciso em suas escolhas, a exemplos de músicas como “NIB” e “Children of the grave”. Já Bill Ward muda a bateria como um todo, fazendo o instrumento não mais compor e ritmar a música - mas servindo como um poderoso coadjuvante dos instrumentos elétricos, mostrando personalidade própria. O bumbo passa a ser usado em tempos alternados e os pratos realçam o som metálico literalmente falando. Na revolução sonora preconizada pelo Sabbath, a bateria parece estar mais viva e com personalidade. Basta ouvir o solo de Ward em “Rat Salad”

 

 

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