Como a guerra na Ucrânia afeta empresas com ações na Bolsa

Por: Eduardo Cucolo

A guerra na Ucrânia deve elevar os custos de empresas brasileiras do setor de alimentos e bebidas que dependem de matérias-primas como trigo e milho, esse último utilizado como ração para animais. Até mesmo o preço de cervejas que levam esses dois ingredientes pode ser afetado caso a crise se prolongue, segundo relatórios do Itaú BBA que analisam companhias brasileiras de capital aberto com ações na B3.

Nos últimos dias, diversos analistas têm apontado que as maiores preocupações neste momento não são os impactos nas exportações brasileiras –a Rússia representa apenas 0,6% das nossas vendas ao exterior. O problema maior estaria nas importações e no preço de algumas commodities.

Rússia e Ucrânia respondem por cerca de 30% das exportações globais de trigo e quase 20% de milho, que tiveram forte alta nos últimos dias.

Um desequilíbrio mundial de oferta de milho pode pressionar as margens da companhia BRF, dada a representatividade do insumo no negócio da empresa –na alimentação de porcos e aves.

"Apesar de enxergarmos a possibilidade da BRF se beneficiar com uma possível quebra na oferta de frango por parte da Ucrânia, entendemos que a inflação de custo do milho deve superar a melhora no cenário dessa proteína, reforçando uma tendência negativa", diz o banco, que manteve recomendação neutra (desempenho em linha com a média do mercado) para o papel BRFS3.

No relatório divulgado na semana passada, os analistas também citam o risco de compressão de margens para a JBS, considerando as operações de frangos e porcos no Brasil e nos EUA.

Por outro lado, nas unidades produtoras de carne bovina o impacto dos grãos deve ser irrelevante, a não ser que toda a cadeia de proteínas fique desequilibrada por um período mais extenso. O Itaú manteve a recomendação de "compra" para o papel JBSS3.

Em relação a outros dois grandes do setor de carnes, os analistas afirmam não ver impactos diretos na Marfrig (a não ser por seu investimento na BRF) e dizem que os dois países não são parceiros comerciais tão relevantes para o Minerva. Foram mantidas as recomendações de "compra" para MRFG3 e BEEF3.

Milho e trigo representam cerca de 10% da estrutura de custos da Ambev, segundo estimativa do banco –algumas utilizam milho e trigo. Mas a companhia possui uma política de proteção (hedge) contra flutuação de preços de aproximadamente 12 meses.

"Avaliamos que os resultados de um aumento nos preços seriam observados apenas em 2023 e caso esta alta permanecesse por um longo período." A recomendação do banco é neutra para ABEV3.

O relatório cita também a M. Dias Branco. Nos três primeiros trimestres de 2021, o trigo representou aproximadamente 43% de toda a estrutura de custos da companhia. A avaliação é que a empresa não está mais conseguindo repassar a inflação para os consumidores na mesma velocidade e grau de antes e que um aumento no preço das commodities pode impactar negativamente as margens.

"Apesar disso, não enxergamos risco de desabastecimento nesse momento, porque o Brasil importa menos de 3% (média de 2018 a 2021) de trigo da Rússia e da Ucrânia." Foi mantida a recomendação neutra para a ação MDIA3. Embora a Camil esteja no setor de massas, segmento dependente do trigo, por meio da Santa Amália, essa operação é pouco representativa. Por isso, não são esperados grandes impactos –recomendação neutra para CAML3.

Em outro relatório, o banco analisou os grandes setores representados na B3 que poderiam ser afetados pelo conflito. A valorização do petróleo e gás, cujos preços devem continuar em alta, deve beneficiar os papéis de PetroRio e 3R.

"Já as implicações para a Petrobras não são tão diretas, uma vez que há uma preocupação na capacidade da empresa de repassar esse aumento para os preços dos combustíveis."

Companhias aéreas, por outro lado, devem ser prejudicadas, dado que empresas como Azul e Gol têm uma parte relevante de seus custos associados aos preços dos combustíveis.

Também é esperado impacto negativo para Natura &Co, pois a Avon Internacional tem cerca de 50% de suas vendas na região do Leste Europeu, uma grande parcela na Rússia.

Os analistas veem ainda efeitos positivos para SLC Agrícola, produtora de algodão, milho e soja, e na CBA (Companhia Brasileira de Alumínio), pois a Rússia é grande produtora também nesse mercado.