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Banqueiros veem crédito mais caro e mudança em reajustes da Petrobras

Por: Julio Wiziack

Embora saiam praticamente ilesos dos impactos diretos da Rússia, grandes bancos brasileiros já preveem uma retração no crédito devido ao aumento da inflação e dos juros, um cenário decorrente da guerra na Ucrânia que retardará ainda mais o crescimento da economia.

A Folha de S.Paulo ouviu três banqueiros sob a condição de anonimato e eles foram unânimes ao afastar qualquer tipo de contaminação do sistema financeiro nacional. No entanto, afirmaram que haverá danos indiretos advindos da erosão de parâmetros da economia.

Na Febraban, associação que reúne as principais instituições, e na ABBC (Associação Brasileira de Bancos Comerciais), a exposição dos bancos nacionais que operam na Rússia virou assunto de reuniões, mas diante dos números apresentados, foi considerada desprezível.

A Febraban disse que seus associados não reportaram "situação que indicasse preocupação".

Dados do BIS, o banco central dos bancos centrais, indicam que as instituições brasileiras têm menos do que US$ 5 milhões em exposição na Rússia.

O peso maior está nas instituições europeias, com quem a Rússia mantém mais relações financeiras.

Ainda segundo os executivos dos bancos consultados, o sistema financeiro nacional sentirá impactos indiretos da guerra, via depreciação do quadro econômico.

Segundo eles, as sanções impostas à Rússia farão aumentar o preço dos alimentos e dos combustíveis em até 15% –Rússia e Ucrânia respondem por cerca de 30% da importação de fertilizantes e adubos.

Alimentos e combustíveis são componentes relevantes na cesta utilizada para o cálculo da inflação que deverá extrapolar o centro da meta, que é de 3,5% em 2022.

Recentemente, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, afirmou que tenta buscar novos fornecedores de fertilizantes, como o Irã (para insumos à base de ureia) e Canadá (fosfato) para reduzir os danos.

De qualquer forma, ainda segundo a ministra, a alta do preço dos alimentos para o consumidor já é dada como certa.

Para os bancos ouvidos pela reportagem, o problema maior virá dos combustíveis. Eles consideram que a política de reajuste de preços da Petrobras terá de ser revista.

Hoje eles percebem que a companhia segura ao menos 10% dos reajustes a cada alta do petróleo. A defasagem, ainda segundo eles, estaria na casa de 30%.

Com a alta acentuada do barril do petróleo, a expectativa é que a petroleira repasse mais rapidamente as altas de preços, algo que terá impacto direto na indústria e nos combustíveis.

Ou seja, para eles, o resultado será aumento da inflação, queda de renda, menos consumo, e crescimento baixo.

O governo avalia segurar os reajustes da Petrobras para conter esse impacto. Nesta segunda, o presidente Jair Bolsonaro (PL) chegou a criticar a atual política de preços da estatal, o que levou as ações da empresa a desabarem na Bolsa.

Em ano eleitoral, os banqueiros avaliam ainda que Bolsonaro disputará a reeleição apresentando um quadro fiscal que, corrigido pela alta da inflação, pode terminar 2022 com superávit primário -em vez de um déficit projetado de 0,7% do PIB.

Um dos banqueiros chamou essa situação de "ilusão monetária", uma maquiagem das contas públicas devido à combinação de inflação alta e depreciação do real. Isso ocorrerá, ainda segundo os banqueiros, às custas da queda da renda da população.

Para eles, esse cenário será favorável às exportações do agronegócio, mas isso não será suficiente para promover o crescimento do PIB.
Há expectativa, também, de aumento dos juros futuros, que devem chegar a 14%. Hoje, estão em 12,5% já considerando o risco político decorrente das eleições presidenciais.

Os juros futuros refletem a insegurança do país diante de riscos concretos que, quanto maiores, mais pressionam para cima os prêmios exigidos pelos investidores.

Os banqueiros, no entanto, percebem uma onda negativa vindo dos EUA, onde a expectativa do mercado é de uma necessidade de corte dos juros básicos para cerca de 1,6% ao ano -hoje estão em 2,5%. O Fed, o banco central americano, vem sinalizando altas.

Esse possível movimento de queda dos juros nos EUA, ainda segundo os executivos, levará à depreciação do real ante o dólar, exigindo esforço de amortecimento pelo Banco Central.

Outra fonte de preocupação decorrente da guerra será a perda de liquidez de todo o sistema financeiro global, que será acionado para cobrir gastos públicos por meio de empréstimos.

Apesar de a Rússia ter dado sinais de que vinha se preparando para a invasão há anos, reforçando sua posição de recursos no caixa e reduzindo exposição a moedas estrangeiras, a reação de empresas e bancos russos surpreendeu.

A asfixia financeira imposta pelas sanções da comunidade internacional deixou companhias aéreas e bancos russos com um fôlego para sobreviver somente um mês com caixa próprio, segundo projeções do mercado. Após esse período, passarão a operar sob risco de falência sem acesso ao mercado de capitais do Ocidente, seu maior financiador até o momento.

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