Maioria dos europeus quer que Otan defenda Ucrânia em caso de guerra contra Rússia

Para o papa Francisco, uma eventual guerra na Ucrânia seria "uma loucura", disse o pontífice durante audiência nesta quarta (9). Para líderes europeus, seria um grande imbróglio e uma crise de segurança no continente. Mas não são apenas autoridades nacionais e o líder da Igreja Católica os preocupados: a população também está atenta e, ao que parece, assumindo um lado no conflito.

Pelo menos 62% dos habitantes de sete países europeus que, juntos, representam mais da metade da população da União Europeia (UE) defendem que a Otan, a aliança militar ocidental liderada pelos Estados Unidos, deve apoiar a Ucrânia caso a Rússia invada o país. Parcela considerável de 60% diz que a UE deve sair em defesa de Kiev. E mais de 50% acham que Washington também tem um papel a assumir.

Os resultados foram encontrados em pesquisa do Centro Europeu de Relações Exteriores (ECFR, na sigla em inglês) divulgada nesta quarta. Cerca de 5.500 europeus de sete países -Finlândia, França, Alemanha, Itália, Polônia, Romênia e Suécia- foram ouvidos no final de janeiro.

O levantamento mostrou que a crise pode estar concentrada no Leste Europeu, mas que a população do continente está certa de que ela vai respingar em outros locais. A preocupação cresce porque muitos acreditam que uma invasão vai, de fato, ser concretizada, a despeito das especulações de que Moscou ameaça o vizinho apenas para barganhar demandas históricas e afastar o Ocidente, sem estar disposto a pagar o preço de mais uma guerra.

Na Polônia, que faz fronteira com a Ucrânia, 73% disseram achar que uma invasão russa é provável ou mesmo muito provável ainda neste ano. Na Romênia, outra vizinha, essa parcela é de 64%. Os mais céticos a essa possibilidade são os finlandeses -somente 44% disseram achar que Moscou vá concretizar a ameaça especulada há meses.

Ainda que diga apoiar Kiev em meio ao conflito, a maior parte dos respondentes está certa de que o avanço russo representa uma ameaça à segurança da Europa em diferentes frentes, sendo a principal delas o abastecimento energético. Mais de 60% dizem que esse seria o principal desdobramento para os demais países europeus.

O assunto é ponto crítico para a Alemanha, até agora um agente diplomático secundário no conflito, que está ligada à Rússia pelo gasoduto submarino Nord Stream 2.

Autoridades alemãs se disseram dispostas a pagar o preço das consequências econômicas para defender Kiev, ao mesmo tempo em que já recusaram enviar armamentos para os ucranianos. Na pesquisa, 59% dos respondentes alemães apontaram o desabastecimento energético como um risco para seu país em meio à crise no Leste Europeu.

A potencial crise migratória desencadeada por uma invasão também está entre as preocupações dos europeus. Pelo menos 48% estariam preocupados com o fluxo massivo de migrantes no continente, sugere o levantamento. Na Polônia, está o maior temor: 77% dizem que o país sofreria as consequências de uma onda de refugiados.

A tensão na fronteira ucraniana se desenrola há meses, desde que o Kremlin concentrou mais de 100 mil soldados na fronteira com o vizinho. Negociações diplomáticas entre o governo de Vladimir Putin e o de Joe Biden falharam, e figuras como o francês Emmanuel Macron e o alemão Olaf Scholz entram, aos poucos, nas mesas de diálogo que buscam estabelecer a paz na Ucrânia.

Os EUA moveram tropas para o Leste Europeu. Já a Otan, no final de janeiro, disse que não moveria seus soldados para a Ucrânia no caso de invasão. Isso porque, justificou o norueguês Jens Stoltenberg, secretário-geral da aliança, a Ucrânia não é um país-membro, ainda que seja um "parceiro altamente valorizado".

Ao britânico The Guardian o diretor e cofundador do ECFR, Mark Leonard, um dos autores da pesquisa, disse que os resultados encontrados apontam para um despertar geopolítico na Europa.

O estudo conclui que uma potencial invasão russa seria interpretada pelos europeus não apenas como um ataque a Kiev, mas à própria ordem de segurança do continente. "Se Putin ameaçou a Ucrânia para forçar os europeus a pensarem na viabilidade da segurança europeia, ele conseguiu", dizem os pesquisadores na conclusão. "Mas, a julgar pelos resultados, o presidente russo pode se surpreender, já que que a maioria dos europeus parece pronta para defender a Ucrânia."