Além da polícia de São Paulo, criminosos também estão na caça de André do Rap

Rogerio Pagnan (Folhapress)

O traficante internacional André de Oliveira Macedo, 43, o André do Rap, solto em outubro do ano passado por determinação do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio Mello, continua na mira dos policiais de São Paulo. Mas não só da polícia. Informes obtidos pelos serviços de inteligência do governo paulista indicam que o integrante do PCC da Baixada Santista também está sendo procurado por outros criminosos, alguns deles querendo matá-lo.

Conforme integrantes de serviços de inteligência relataram à Folha, parte dos criminosos quer o fim do traficante para se livrar de dívidas. São bandidos com pendências financeiras com Macedo e que estariam tentando matá-lo para fugirem do pagamento. De acordo com policiais civis ouvidos pela reportagem, que analisam as transações financeiras de André do Rap, estima-se que ele tenha movimentado cerca de R$ 500 milhões em cinco anos e tenha cerca de R$ 50 milhões em patrimônio (incluindo dinheiro). Parte desse dinheiro estaria emprestado a colegas do crime.

Mas não só maus pagadores atrás dele, segundo os serviços de inteligência. Também estariam nessa busca integrantes do próprio PCC descontentes com André, por falta de cumprimento com obrigações perante a facção. Ele não estaria "comparecendo com a responsa", segundo relatos ouvidos. Todo criminoso batizado pelo PCC precisa cumprir uma série de obrigações quando está em liberdade, como pagamento de mensalidades ('cebola'), compra de rifas (para serviços assistenciais), além de missões específicas determinadas pela cúpula.

Os policiais não sabem exatamente o que ele teria descumprido, mas ele ainda não teria sido "decretado". Isso equivaleria a uma ordem de assassinato. A morte de membros do PCC pela própria facção não é uma coisa rara de acontecer. Dois integrantes da cúpula, Rogério Jeremias de Simone, o Gegê Mangue, e Fabiano Alves de Souza, o Paca, por exemplo, que tinham posições muito superiores à de André do Rap na quadrilha, foram assassinados em 2018, segundo a polícia, por ferir regras.

De acordo com policiais, ainda que André venha a descobrir que está sendo caçado pelos colegas do crime, ele não pode simplesmente se entregar à polícia e voltar a prisão, para fugir dos algozes. Até poderia, na verdade, mas isso seria algo péssimo para ele.

Há uma regra do PCC, ainda segundo esses policiais, que proíbe que membros do grupo se apresentem voluntariamente à polícia, quando estão sendo procurados -caso de André do Rap. É uma forma de impedir que membros da facção, em dívida com integrantes da cúpula, fujam de suas obrigações. Isso porque um criminoso que tenha dívidas com drogas, por exemplo, está desobrigado desse pagamento enquanto estiver preso. O descumprimento dessa regra pode levar até a morte.

Outra implicação da volta do traficante à prisão é o tratamento que seria dado a André do Rap pela Justiça. Depois de ter participado de um escândalo nacional, dificilmente o traficante seria tratado como um preso comum e, assim, deverá passar um bom tempo da cadeia.

Policiais avaliam não ter sido uma boa estratégia a obtenção das benesses pelo traficante com o STF, da forma como ocorreu. André do Rap estava preso havia pouco mais de um ano, após ser localizado pela polícia paulista em uma casa de luxo em Angra dos Reis (RJ). Estava sendo procurado havia meses e, ao ser localizado, teria oferecido R$ 10 milhões aos policiais para ser solto. Não tentou usar de violência.

De acordo com dados da Justiça, André do Rap estava condenado a 15 anos, 6 meses e 20 dias de prisão. Ele recorria da decisão, emitida em 2013, e ainda sem trânsito em julgado. O traficante também foi condenado a 14 anos de reclusão, porém, após acórdão do TRF (Tribunal Regional Federal) 3, a pena foi reduzida a 10 anos, 2 meses e 15 dias, em regime fechado. Foi mantida a prisão do réu por, entre outros motivos, envolver a apreensão de quatro toneladas de cocaína de tráfico internacional. Em ambos os processos, o ministro Marco Aurélio, do STF, concedeu habeas corpus.

Ele foi solto sob a justificativa de que estaria preso, sem uma sentença condenatória definitiva, além do limite de tempo previsto na legislação brasileira. O ministro utilizou o artigo 316 do Código de Processo Penal, que trata da necessidade de rever a prisão a cada 90 dias.

André do Rap foi solto no dia 10 de outubro, um sábado. O presidente do STF, Luiz Fux, chegou a suspender a decisão do colega nesse mesmo dia, mas, quando isso aconteceu, o criminoso já estava solto em local ignorado e passou a ser considerado foragido.

A polícia descobriu posteriormente que o traficante tinha até um plano de despistar sua fuga, que incluía a divulgação de vídeos pela família nas redes sociais como se estivesse deixando o país em um jatinho. As imagens eram, porém, antigas e o caminho dele é desconhecido até agora.

Conforme a Folha revelou, André do Rap tinha tanta certeza da soltura dele pela Justiça que antes mesmo da decisão do STF já dava certa sua vitória nos tribunais. "Não passo o Natal aqui dentro", dizia ele a colegas do presídio de segurança máxima de Presidente Venceslau (SP), segundo relatos de integrantes da cúpula da segurança de São Paulo.