As cidades e o Ano Novo

Por Vicente Loureiro*

O que poderia ser uma auspiciosa mensagem de Ano Novo para boa parte das cidades brasileiras? O que lhes desejar de essencial que possa ser feito de fato e tenha o poder de mudar o rumo das suas vidas já em 2022? Como convencê-las da chegada de novos tempos, se os do presente e passado recente foram tão prejudicados por uma degradação urbanística e ambiental visível e aparentemente incontrolável? O que seria factível esperar delas no futuro próximo?

Em primeiro lugar, fazendo votos que elas deixem de ter tanta gente sem casa e que a redução da falta de moradia possa ser paulatina e ininterrupta. Objetivamente: que elas deixem de gerar excluídos com a oferta regular e constante de moradias sociais acessíveis e adequadas. Difícil, mas não impossível.

Que as ações de suas políticas de desenvolvimento urbano estejam focadas nos mais vulneráveis. Procurando atender de modo universalizado, sem deixar ninguém para trás, as necessidades de morar, usufruir e circular nas cidades e fazendo com que a reprodução da vida urbana se dê modo mais justo e inclusivo. Seguindo o mote de incluir para melhorar.

Que consigam conter a expansão de seus territórios, reduzindo o espraiamento e precarização de suas periferias e a favelização de áreas ambientalmente sensíveis ou expostas à riscos. Não enfrentarem de frente este problema significa afiançar a degradação urbanística, social e ambiental da cidade como um todo. É desafiante, mas inadiável.

Integrar esforços das políticas setoriais visando promover uma reprodução da vida humana cada vez mais saudável e sustentável. Mudando o rumo das intervenções para enfrentarem as causas do modelo de urbanização tão desigual e não seus danoso e conhecidos efeitos. Acolher para não seguir excluindo.

Mas, para que tais votos de um bem-aventurado Ano Novo tragam dias melhores para as cidades é indispensável que elas assumam o protagonismo da política habitacional. Espelhando-se, se possível, no modelo do SUS, onde a gestão dos recursos é tripartite, mas a produtividade dos governos locais é responsável pela definição das metas e da alavancagem dos recursos. Quem deve, cumpridos certos requisitos, procurar bater metas de oferta de moradias são as cidades, não os agentes financeiros. Estimular as cidades, não as tutelar.

Por fim, não se pode esquecer que 2022 é ano de eleições para os governos federal e estaduais. Já é passada a hora das cidades merecerem dos candidatos propostas mais condizentes e proporcionais a responsabilidade a elas delegada de abrigar e prover a vida de mais de dois terços dos brasileiros. O futuro da nossa gente, inclusive o da democracia, passa pelo fortalecimento das cidades. Nelas moram nossos principais problemas. Residem nelas também as possíveis soluções. Então, que 2022 seja mais das cidades e menos de Brasília. Feliz Ano Novo.

*Arquiteto e urbanista