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Presidente caricato e bufão

Por Nilson Mello*

A invasão do Capitólio na semana passada por manifestantes supremacistas – os radicais extremistas apoiadores do Partido Republicano – foi certamente a maior fissura já sofrida pelas instituições democráticas americanas. Não pelo ato em si, levado a cabo por algumas centenas de aloprados inconsequentes, uma minoria mesmo entre a chamada “direita conservadora”, mas pelo fato de ter sido incitada por ninguém menos que o presidente Donald Trump, e por um motivo torpe: a recusa em aceitar a derrota nas urnas.
Insatisfeito com o resultado das eleições, Trump tentou um golpe digno de “Republiqueta de Bananas”, mas fracassou justamente porque se deparou com a sólida democracia americana. Primeiro, as alegações de fraude para invalidar o pleito foram criteriosamente rejeitadas pela Justiça e pelo Congresso. Pouco a pouco também foram desmoralizadas pela imprensa e desconsideradas pela maioria dos políticos do próprio partido Republicano.
Sobrou como último e melancólico ato de um presidente caricato, que se notabilizou mais como bufão do que como verdadeira liderança, uma tomada de poder à força. Sairá pelos fundos da Casa Branca, bem menor do que entrou – o que parecia impossível. Seu ato tresloucado, conclamando uma turba de desordeiros, foi algo tão inimaginável para um presidente da maior potência global que, na sequência, discutia-se nos círculos de Poder em Washington se Trump estava de posse de suas faculdades mentais – uma dúvida que, na verdade, antecede a sua chegada à Presidência.
Declaradamente louco ou não, o fato foi que a 25ª Emenda, que autoriza o impeachment do presidente por incapacidade, passou a ser cogitada. A medida extrema só não deve ser adotada porque restam poucos dias para o fim do mandato. As redes sociais agiram rápido e cassaram-lhe a conta. Suprema humilhação. A presidente da Câmara, Nancy Pelosi, chegou a fazer consultas reservadas aos altos escalões do Pentágono sobre o risco de Trump, num ato derradeiramente alucinado, acionar o disparo de um artefato nuclear.
Vale dizer que a horda que atendeu ao chamamento para a tomada do Capitólio parecia, ela própria, ter saído de um hospício, com algumas figuras lembrando os integrantes do Village People, o que não deixa de ser uma incongruência tendo em vista o perfil do velho grupo musical. Brincou-se que faltou a Trump o apoio de uma grande potência militar, e das próprias Forças Armadas – uma referência aos golpes na América Latina, promovidos por militares, com a ajuda dos EUA. Mas, ao final, o que se viu foi o triunfo e o fortalecimento das mesmas instituições que estavam sob o ataque inconsequente. A democracia vencendo os extremos.
Quem não entendeu o que aconteceu? O presidente Jair Bolsonaro, que segue dizendo que houve fraude nas eleições americanas e questionando as urnas eletrônicas brasileiras (a despeito de lhe terem dado a vitória em 2018), para afirmar que, na eleição de 2022, no Brasil, “será pior”. Outro bufão caricato?

*Jornalista e advogado.

 

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