Livre de ingerências

Por Nilson Mello*

No primeiro teste para dizer a que veio sob nova direção, o Congresso se saiu bem, aprovando um projeto de caráter técnico, há muito esperado, em regime de urgência, o que contribui para afastar, ao menos por enquanto, os receios de uma autuação marcadamente fisiológica, em detrimento da desafiadora pauta de reformas com a qual se comprometeu.

A Câmara aprovou a autonomia do Banco Central, uma medida que há 30 anos dormitava nos escaninhos do Legislativo, sem que houvesse empenho por parte dos governos ou de parlamentares em transformar a matéria em realidade, a despeito de ser um consenso entre economistas em todo mundo.

O Projeto de Lei Complementar (PLP 19 de 2019), que já havia sido aprovado pelo Senado, era um dos itens da lista de 35 “reformas” prioritárias encaminhadas pelo Executivo ao Legislativo, no início do mês, por ocasião das eleições dos presidentes das duas Casas. Dá para dizer que daqui para frente o comportamento do Congresso será sempre assim? Não dá.

De acordo com nota do próprio BC sobre a aprovação, a doutrina econômica e a experiência internacional mostram que a autonomia da Autoridade Monetária contribui decisivamente para se alcançar níveis mais baixos de preços e conter a volatilidade da inflação, sem prejudicar o crescimento econômico. Pelo projeto aprovado, o órgão não estará mais vinculado ao Ministério da Economia e passa a ter autonomia técnica, operacional, financeira e administrativa.

Para ficar livre das ingerências políticas, o mandato de seu presidente não mais coincidirá com o do presidente da República, com diferença de dois anos, e os de seus nove diretores serão escalonados, com início também intercalado.

Não foram poucas as vezes ao longo da história que o Brasil utilizou indevidamente o Banco Central para fazer política social, com resultados sempre insuficientes ou até desastrosos (hiperinflação). Política monetária não é o instrumento apropriado para se fazer política social. Medidas populistas e demagógicas são contrárias ao papel de guardião da moeda.

Partidos que se autoproclamam “progressistas” se colocam invariavelmente contra a autonomia do BC (algo que a votação no Congresso confirmou). Não entendem que não é o mercado financeiro que se beneficiará de sua independência, mas a sociedade, que passará a contar com uma condução técnica na política monetária, livre de interferências indevidas.

*Jornalista e advogado