Salvemos os velhos trenzinhos da E. F. do Corcovado

Por Antonio Pastori*

Daqui a alguns dias o Rio de Janeiro corre o risco de ver mais uma preciosa parte do seu Patrimônio Ferroviário indo para o vinagre. Serão leiloados cinco carros de passageiros antigos (1970) do Trem do Corcovado, em virtude de terem entrado em operação, em 2019, novos trens mais eficientes econômicos. O leilão será realizado pela firma MGL no dia 31/03/2021.

O mais espantoso é que essa possível destruição tem o patrocínio – não do operador do trem –mas, nada mais nada menos, que o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, o ICM-Bio. Pois é – acredite o leitor – trata-se de mais uma daquelas jabuticabas made in Brazil, ou seja: um órgão governamental tem a posse de uma ferrovia, que no caso trata-se da Estrada de Ferro do Corcovado-EsFeCo, no Rio de Janeiro. Pelo leilão dos cinco trens a expectativa é de que seja arrecadado, talvez para reforço do caixa do ICM-Bio, cerca de 300 a 400 mil reais, uma mixaria em se tratando do valor patrimonial e afetivo desses veículos.

Inaugurada por Dom Pedro II em 1884, essa pioneira Estrada de Ferro de 136 anos, com apenas 3,8 km de extensão, carrega dois títulos Históricos: foi a primeira EF eletrificada no Brasil e é também a nossa primeira ferrovia turística, elevando os passageiros a mais de 700 metros de altura até os pés do Redentor.

Além de seus trens serem absolutamente seguros (nunca houve um acidente que vitimasse um só passageiro), e não poluentes, esses veículos carregaram anualmente mais de meia centena de milhares de turistas que se encantaram, não só com a estonteante paisagem da Cidade Maravilhosa, mas também pelo belíssimo passeio em meio à maior floresta urbana replantada do mundo. Pedro II, o cientista Albert Einstein, Santos Dumont, a princesa Diana e até o Papa João Paulo II e muitos outros, fizeram esse passeio. Contudo, o aço desse trenzinho poderá virar uma bonita tampa de bueiro na Avenida Presidente Vargas...

Mas, se derem sorte, os trenzinhos poderão ir para as mãos de algum colecionador aficcionado por trens; ou, melhor ainda, para algum grupo de pobres ferroviaristas zelosos com a preservação da História das nossas ferrovias, com a esperança de que um dia, quem sabe, possamos ver esses veículos rodando na Serra de Petrópolis (nosso Projeto do Trem Expresso Imperial), que foi inaugurado em 1883, um ano antes da EsFeCo, e erradicado em 1964.

Na época da Maria-Fumaça, a viagem de trem entre o Rio e Petrópolis durava 1h45, muito menos que hoje no horário do rush. Com esse velhos carros do trenzinho do Corcovado poderíamos fazer essa viagem – pasmem! – em menos de uma hora e meia, sem o risco de acidentes, assaltos, interrupções por conta de congestionamentos, barreiras, etc., além do que, trem não paga pedágio meu irmão, e você pode viajar sentado comodamente, podendo até trabalhar com o seu laptop enquanto viaja, como fazem em toda Europa. Chique, não?

Mas, enquanto certos órgãos públicos que deveriam zelar pela preservação física e pela memória do nosso patrimônio forem comandados por gente de mentalidade talibã, que só vê cifrão – ou empecilho – nas nossas matas, prédios antigos e na biodiversidade, só nos resta chorar. Dizem as más línguas, que esses talibãs tupiniquins que estão à frente de órgãos ambientais e memoriais no Brasil, se tivessem o poder de decidir pelos destinos das Pirâmides do Egito, do Coliseu Romano, do Grand Canyon nos EUA, e de outras maravilhas, elas seriam vendidas como material de construção: pedras, tijolos e areia em promoção. Persignemo-nos!

Resta a esperança que o nosso Governador e Prefeito, com o apoio dos nossos Deputados federais e estaduais e mais os Vereadores, Associações ligadas ao Trade Turístico Fluminense, Associações de Engenheiros, Arquitetos, Ferroviários e Ferroviaristas, FIRJAN, ACRJ, IPHAN, INEPAC, a mídia em geral e todos aqueles que não sejam talibãs cariocas, saiam em defesa do Rio e brequem esse nefasto leilão o mais rápido possível. Ou, então, nos consigam uns R$ 500 mil reais para arrematar esse lote de cinco trens. Enquanto isso, oremos, pois!

(*) Ferroviarista, Mestre em Economia e Pós-graduado em Engenharia Ferroviária.