Tome jeito

Por Jolivaldo Freitas*

Quando você dá R$2 por fora, sem cartela, para economizar R$ 1 na Zona Azul ou oferece uma cervejinha; molha a mão do porteiro do estádio, leva um presentinho para o burocrata de uma secretaria, paga para ser dos primeiros da fila, oferece um brinde ao fiscal ou até mesmo dá um trocado para colocar uma pulseira Vip num camarote está realizando o velho hábito do mais antigo esporte brasileiro que é a corrupção.

Portanto não é de hoje, destes períodos pós Mensalão e Lava Jato que a corrupção se afirma. Todo mundo, com raríssimas exceções, já cometeu um pequeno ato de levar vantagem em alguma coisa (estou falando da velha Lei de Gerson, aquela da propaganda do cigarro Villa Rica em que o antigo jogador da Seleção Brasileira fez a besteira, e foi mal interpretado, nos idos de 1976, de dizer que gostava de levar vantagem em tudo e pagou feio por isso) e com isso já corrompeu ou foi corrompido. Sabe-se lá, corrompe até com um vinho, uma caixa de chocolate, par de meias, uma calçola, uma gravata. Por sexo.

Daí que a corrupção não afeta somente aos políticos, aos ministros, presidentes e partidos. Em todo setor social tem uma pitada de corrupção que pode ser até mesmo aquele inofensivo agrado ao chefe para folgar num feriado prolongado; ao delegado para agilizar a investigação; ao juiz e ao desembargador para acelerar ou escamotear o processo. Ao pular a catraca do ônibus ou metrô.

Mas este tipo de fato vem de longe. Vem lá de Portugal que bem antes do século XVI só funcionava na base do toma lá dá cá com os cartórios e os fidalgos. Então eu pergunto: quem viria para um Brasil a ser desbravado para enfrentar índio e onça sem um agrado da Coroa, uma possibilidade de escambo e negociata? Então as autoridades reinóis faziam de conta que nada viam sobre o que acontecia por aqui e cada um fazia o que queria sob vistas grossas, inclusive vender, comprar e negociar com os próprios inimigos de Portugal, contanto que se enchesse a burra. E cada um levava seu quinhão e o Brasil seguia em frente. Com a chegada de Dom João XVI e sua corte de comerciantes, burocratas e encostados então a corrupção no Brasil adquiriu asas.

Mas não ache que a corrupção é coisa somente do Brasil. Ela custa quase R$ 400 bilhões para as economias dos países da União Europeia a cada ano segundo a Comissão de Assuntos Internos da EU, num levantamento estimativo e que pode ser muito mais. Os 28 membros da UE enfrentam a corrupção sistêmica e ninguém está livre.
Quando você comemora o trabalho de um Joaquim Barbosa, do Sérgio Moro, da equipe do Ministério Público e a ação da Polícia Federal, mesmo com o ministro Edson Fachin abrindo a guarda, está agindo de forma correta em busca de um Brasil melhor e menos vergonhoso. Mas quando você usa carteirinha de estudante para pagar meia no cinema e no teatro ou estaciona na vaga do idoso está na contramão, e como diria sua avó: “tome tenência” . O Brasil ainda tem jeito.

*Escritor e jornalista.