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O julgamento no STF: Dai a César o que é de César

 
Por Sergio Batalha Mendes*
 
O fato mais relevante no julgamento Supremo não foi o teor dos votos proferidos e sim a sustentação oral do Advogado-Geral da União. André Mendonça praticamente não citou argumentos jurídicos. Fez, na verdade, uma pregação religiosa, como se fosse um sacerdote em um púlpito, citando três trechos da Bíblia e culminou com a afirmação de que “os religiosos não estão matando pela sua fé, mas estão dispostos a morrerem por ela”.
 
A sustentação não foi dirigida aos Ministros da Corte, muito menos ainda teve a intenção de convencê-los da justiça de manter os templos abertos durante a pandemia. O objetivo foi jogar os evangélicos contra o STF e mantê-los mobilizados em torno de uma batalha ideológica. O método de fazer política do bolsonarismo exige uma guerra ideológica permanente e inclui a utilização da religião como campo de batalha.
 
A manipulação política da fé religiosa dos evangélicos tem como objetivo mantê-los na base de apoio de Bolsonaro, impedindo-os de analisar objetivamente a atuação do governo. Na guerra santa só existem os fiéis e os inimigos da religião.
 
É urgente e estratégico hoje para todos os democratas enfatizar a separação da religião do Estado. Não devemos combater os evangélicos e sim dialogar com a massa de fiéis, ignorando os líderes da manipulação, sobre a importância de não confundir suas crenças religiosas com as políticas de Estado. O evangélico tem o direito a cultuar seus próprios valores morais e de observar em sua vida pessoal os padrões de comportamento que acredita serem compatíveis com suas crenças. Temos de respeitar essas crenças e assegurar sua liberdade de viver de acordo com elas. Assim, também poderemos exigir o direito aos nossos próprios padrões morais e de comportamento, independente deles desagradarem a outros.
 
O mundo terreno não pode ser submetido ao mundo espiritual. Neste sentido, é famosa a resposta de Jesus Cristo à indagação sobre se seria lícito um judeu pagar impostos aos romanos: “Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.” (Mateus 22:21).
 
Logo, não é nova, nem estranha à própria religião, a necessidade de não se confundir seus preceitos com a esfera pública do governo dos homens em sociedade.
 
Os evangélicos não são algozes dos seus compatriotas, mas vítimas como eles do péssimo presidente eleito com a manipulação do seu voto.
 
A fome e o genocídio trazidos por Bolsonaro não discriminam religião ou valores morais, atingem a todos e sua superação é tarefa também de todos os brasileiros.
 
*Advogado