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Diversidade ganha força para desconstruir estereótipos

Por Francisco Guarisa*

Historicamente, em uma sociedade capitalista neoliberal, vimos o tema diversidade como algo distante, especialmente quando falamos em estratégias de comunicação de massa. Por décadas, empresas ofereceram produtos e/ou serviços com a percepção de que éramos iguais e a tendência de valorizar uma cultura hegemônica e globalizada. Tal fato, fez com que diferenças importantes fossem negligenciadas e desconsideradas, desprezando a idiossincrasia da miscigenação, culturas e tradições.

Ao mesmo tempo, a globalização e a democratização da informação ao redor do mundo, alavancada pela famosa “world wide web”, possibilitou um movimento importante, iniciando um diálogo mais plural entre diferentes grupos. Gerou também divergências construtivas, reflexões e reconhecimentos relevantes relativos à identidade. Neste caso, vale lembrar o trabalho da filósofa alemã Hannah Arendt, que ao longo de sua vida valorizou a importância de uma sociedade plural, seja nas esferas políticas, sociais ou culturais. Arendt, destacou em suas obras que graças ao pluralismo, o potencial de uma liberdade e igualdade poderia ser gerado entre as pessoas, facilitando o processo de inclusão do “outro”. Só complementaria que, além da inclusão, é fundamental a aceitação. A filósofa ainda destaca que a pluralidade é a “diversidade infinita de perspectivas diferentes e únicas produzidas pela interação entre os homens”.

Esse movimento, para o descontentamento de alguns ainda presos à constructos preconceituosos, tem proporcionado grandes mudanças nas relações pessoais e profissionais. Por exemplo, trabalhar em uma organização inclusiva, que aceita a diversidade de gênero, credo ou idade, já não é mais improvável nos dias de hoje. Ver campanhas publicitárias disruptivas, fugindo dos estereótipos que durante séculos ofuscaram uma convivência mais igualitária, também demonstra que pessoas e empresas estão mais reflexivas e no caminho para a construção de um mundo mais humano e de convivência plural. Tal fato não significa que estamos em um estágio ideal, mas considero ser um processo em fase de “amadurecimento sustentável”.

O ecossistema digital, em especial as redes sociais, fez com que as estratégias de marketing envolvendo questões ligadas à diversidade ganhassem relevância e um certo protagonismo. Empresas estão sendo compelidas a assumirem posições perante a sociedade. Até mesmo, não se posicionar já é uma forma de posicionamento, que obviamente carrega em si uma série de riscos, pois este ecossistema se manifesta de maneira cada vez mais contundente. Como consequência, o que não falta hoje é logomarca de empresas ajustadas à causa LGBTQIA+, como também um crescimento de campanhas publicitárias incluindo temas como diversidade de gênero, mulheres, mulheres negras, pessoas com 60+, deficientes, entre outros. Se elas estão ligadas às mudanças reais de propósito e valores, se são oportunidades ou oportunismos, o ecossistema se encarregará de aceitá-las ou expurgá-las.

Ainda assim, um longo caminho precisa ser trilhado e não é fácil desconstruirmos estereótipos. Há décadas eles estão arraigados ao nosso modus vivendi, tais como: o racismo estrutural como algo histórico e banal, a superação de deficiência como ato de heroísmo, as causas de diversidade de gênero muito além do arco-íris e o universo 60+ sem imagens em tons pastéis, campos e horizontes lindos à espera da morte.

Espero que esse caminho seja reconstruído através de uma convivência mais humana e plural, em todos os sentidos. Precisamos ainda zerar os juízos de valor históricos em relação aos negros, tendo como exemplo o ocorrido recentemente na porta de um shopping da zona sul do Rio de Janeiro, em que jovens brancos duvidaram da propriedade de uma bike elétrica por um jovem negro, inferindo que ele a havia furtado. Assim como, o desrespeito explícito à diversidade de gênero, exemplificado pela manifestação agressiva de diversas pessoas nas redes sociais, que rejeitaram a campanha de uma marca de cosméticos para o Dia dos Pais, simplesmente porque o protagonista era um pai transsexual.

Uma coisa é certa, vivemos em um mundo diverso, volátil, extremamente dinâmico e sem mágicos de Oz, onde não cabe mais hipocrisias, oportunismos, falsas caridades, intolerância, violência, homofobia, sexismo, machismo e misoginia. Pessoas e empresas que ainda não aceitam este novo ecossistema complexo, plural e que buscam no outro extremo do arco-íris um teórico final feliz, ao chegarem lá, pelo cheiro sentirão no que vai dar.


*Consultor e Executivo de Marketing e Gestão

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