Dedutibilidade do imposto de renda das despesas com casas de repouso

Por Sergio Pinto Martins

Com o avanço da idade e o acometimento de enfermidades graves, que obstam o tratamento residencial, muitas famílias são obrigadas a recorrer a estabelecimentos especializados para o cuidado dos mais idosos.

Estabelecimento especializado que cuida de idosos deve ter obrigatoriamente atendimento médico, bem como possui várias enfermeiras com atendimento 24 horas por dia, contrata fisioterapeutas e faz fisioterapia,  cujo trabalho vai desde o fortalecimento muscular até a melhora pulmonar, tem nutricionista e comida balanceada para os idosos, além de responsável técnico, etc. A maioria das casas de repouso para idosos tem isso. Questão que tem sido apresentada é se pode haver a dedução como despesa na declaração de imposto de renda da pessoa física desse estabelecimento para idosos?

A Câmara de Recursos Fiscais já julgou que as referidas despesas não podem ser deduzidas do imposto de renda da pessoa física (2ª T, 2ª Seção, Rel. Maria Helena Cotta Cardozo, publicação 30.5.2019). A possibilidade de êxito na postulação no âmbito administrativo até a Câmara de Recursos Fiscais é zero.

As casas de repouso de idosos emitem nota fiscal do Município, tem CNPJ, estando devidamente estabelecidas no âmbito estadual e municipal. Devem ter responsável técnico para estabelecimentos de saúde, cumprindo todas as obrigações legais. A maioria é microempresa, estando devidamente inscritas perante a Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Dispõe artigo 96 da Instrução Normativa RFB n.º 1.500, de 29 de outubro de 2014, que “as despesas de internação em estabelecimento geriátrico somente são dedutíveis se o referido estabelecimento for qualificado como hospital, nos termos da legislação específica”. O referido dispositivo não tem previsão em lei. Viola, portanto, o princípio da legalidade (art. 5.º, II, da Constituição).

A norma administrativa tem por objetivo esclarecer o conteúdo da lei, regulamentá-la. Entretanto, não tem o Brasil regulamento autônomo, mas apenas regulamento de execução da lei (art. 84, IV, da Constituição). O conteúdo da norma administrativa é predeterminado pela lei. Não pode, assim, exceder dos limites legais, sob pena de imediata ilegalidade. Dispõe o artigo 37 da Constituição que a Administração Pública deve agir de acordo com o princípio da legalidade. Logo, descabida a previsão de norma administrativa que não tem previsão em lei.

A Pergunta 347 do Perguntas e Respostas do Imposto de Renda da Secretaria da Receita Federal tem a seguinte redação: Despesas de internação em estabelecimento geriátrico são dedutíveis a título de hospitalização apenas se o referido estabelecimento se enquadrar nas normas relativas a estabelecimentos hospitalares editadas pelo Ministério da Saúde e tiver a licença de funcionamento aprovada pelas autoridades competentes (municipais, estaduais ou federais).

Esses estabelecimentos especializados de atendimento aos idosos se enquadram nas normas do Ministério de Saúde, tanto que têm que cumprir rigorosos protocolos de saúde e têm licenças aprovadas por entidades municipais e estaduais.  Logo, deveria ser autorizada a dedutibilidade.

Se o contribuinte observou os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas, como da pergunta 347 do Perguntão, não pode responder pela imposição de penalidades, cobrança de juros de mora e atualização do valor monetária da base de cálculo do tributo (art. 100 e parágrafo único do CTN).

O código de atividade de casas de repouso CNAE 8711-5-02 não é o que revela a natureza do estabelecimento que cuida de idosos. Isso não quer dizer nada. Tem que se investigar realmente do que se trata. A natureza jurídica de um estabelecimento é indicado efetivamente pelo que ele é, pela sua essência, pelo que faz e não pelo código que o fisco o enquadra.

A multa aplicada em caso de a declaração de imposto de renda cair em malha fiscal de 75% é ainda excessiva. Tem característica de confisco (art. 150, IV, da Constituição). Representa mais da metade do que é devido de imposto.

Uma vez apresentada a declaração completa até o prazo de entrega, não é permitido depois optar pelo desconto padrão, que tem tributação menor do que a primeira. Ninguém é obrigado a pagar mais imposto do que é devido, sob pena de caracterizar confisco.

A Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais da 4ª Região entendeu que se a casa de saúde promove cuidados diferenciados aos idosos e oferece serviços de proteção da saúde física e mental para assegurar a dignidade da pessoa humana, a despesa é dedutível do imposto de renda pessoa física.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região entendeu possível a dedução da despesa de estabelecimento geriátrico: "A intenção do legislador foi a de garantir a dedução de despesas médicas com os profissionais da saúde, bem como entidades que assegurem direito de atendimento ou ressarcimento de despesas da mesma natureza. É certo que a idade avançada enseja cuidados em relação à saúde física e mental, mesmo que não presente alguma doença específica, justificando a dedução das despesas com casa de repouso quando oferecidos esses serviços específicos".

A pessoa deve ter direito de deduzir despesas que são essenciais, como essa, num momento difícil da vida da pessoa, que não tem mais condições físicas e precisa da ajuda de pessoal especializado para comer, para ir ao banheiro, para tomar banho, etc. É o direito à vida  (art. 5.º, caput, da Constituição) digna da pessoa. É o direito de cuidar da sua saúde (art. 196 da Constituição), como direitos fundamentais da pessoa humana.

Não se pode admitir que tal despesa seja considerada renda (art. 153, III, da Constituição) para efeito de tributação. A matéria, portanto, precisa ser debatida nos tribunais.

*Desembargador Corregedor do TRT da 2ª Região