Saúde mental e trabalho

Os Jogos Olímpicos de Tóquio ficarão marcados pelo caso da ginasta norte-americana que desistiu de algumas provas por não conseguir lidar com seus “demônios internos”. A notícia de que um transtorno mental impediu uma atleta consagrada, favorita, no auge da forma física – sem “nada de errado”, enfim – de disputar uma medalha olímpica lançou luz sobre um problema normalmente envolto em preconceito e desinformação, numa oportunidade de discutir seus efeitos de maneira séria e equilibrada.

Antes de tudo, devemos expressar nossa solidariedade à atleta, desejando uma plena recuperação, e agradecê-la pela coragem de se expor desta forma. É um alento para milhões de portadoras da mesma doença. Pessoas que, temendo o rótulo de fracas, preguiçosas ou até de má índole, tentam esconder sintomas de depressão, ansiedade ou síndrome do pânico, perdendo a chance não apenas de buscar tratamento, mas também de usufruir seus direitos – entre eles, os trabalhistas.

Diante do glamour de uma Olimpíada, pouca gente se dá conta de que os atletas são profissionais. Cada salto, braçada ou chute a gol é, para eles, um momento de trabalho, pelo qual são remunerados. Quando um deles, por motivo de saúde, desiste de uma prova, está exercendo um direito comum a todos com carteira assinada: ausentar-se em caso de doença, desde que atestada por um médico. Um benefício não somente ao trabalhador, mas também às empresas e consumidores, pois diminui o risco de acidentes e falhas na produção.
Infelizmente, no caso dos distúrbios mentais, esse direito nem sempre é exercido, por desconhecimento da lei ou medo do “julgamento” preconceituoso de colegas e até da família. É preciso lembrar, sempre, que essas doenças não são fraquezas de caráter, podendo inclusive ter causas físicas, e que nosso sistema público de saúde, com seus profissionais competentes e dedicados, está pronto para o diagnóstico e tratamento. Que o exemplo da ginasta e de outras personalidades que vêm expondo problemas psíquicos sirva de inspiração para os milhões de brasileiros que passam, muitas vezes desnecessariamente, pelo mesmo sofrimento.

Grande Benfeitor da Academia Nacional de Medicina e professor de Psiquiatria da PUC-Rio