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Concentração de execuções contra devedores

A execução é o calcanhar de Aquiles do processo do trabalho

Por Sergio Pinto Martins*

A execução é o calcanhar de Aquiles do processo do trabalho, seu ponto fraco. Também costuma fazer menção à vitória de Pirro. O trabalhador ganha, mas não leva.

A concentração das execuções é a reunião de vários processos na fase de execução, com trânsito em julgado, visando que os créditos sejam executados num único processo e muitas vezes com uma única garantia de um valor global, que serviria para todos os processos.

Na omissão da CLT sobre execução, primeiro se aplica a Lei de Execução Fiscal e, omissa essa, o CPC (art. 889 da CLT). O juiz pode, por conveniência da unidade da garantia da execução, ordenar a reunião de processos contra o mesmo devedor (art. 28 da Lei n.º 6.830/80). É uma faculdade e não uma obrigação do juiz. Evita-se a duplicidade de atos. Permite que um dos atos sirva aos demais processos na execução.

Existe a possibilidade de se cumular várias execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, quando o executado for o mesmo e desde que para todas elas seja competente o mesmo juízo e idêntico o procedimento (art. 780 do CPC). Não é possível, portanto, que sejam executados diferentes. Não se exige, porém, que os exequentes sejam os mesmos. Competente é o juiz do trabalho da Vara do Trabalho local.

A execução se realiza no interesse do exequente (art. 797 do CPC). Entretanto, quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado (art. 805 do CPC). Às vezes não há, porém, outros meios para se fazer a execução.
Utilizando-se por analogia do artigo 47 da Lei n.º 11.101/05, a concentração das execuções no processo do trabalho tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

O Poder Judiciário disciplinará o Regime Centralizado de Execuções, por meio de ato próprio dos seus tribunais (art. 15 da Lei n.º 14.193/21). Isso significa que a regulamentação será feita pelos Tribunais. Isso tanto ocorrerá nos Tribunais de Justiça, em relação a dívidas cíveis, como em relação aos Tribunais Regionais do Trabalho, quanto às dívidas trabalhistas Apenas se os Tribunais Regionais do Trabalho não regulamentarem o Regime Centralizado de Execuções, competirá ao Tribunal Superior suprir a omissão (§1.º do art. 15 da Lei n.º 14.193/21), que, no caso da Justiça do Trabalho, é o TST. Parece que a Lei n.º 14.193/21 e seu artigo, por ser posterior e ter regulado inteiramente o Regime Centralizado de Execuções, inclusive estabelecendo vários procedimentos, revogou o artigo 50 da Lei n.º 13.155/15.

O Regime Centralizado de Execuções também pode ser aplicado por analogia para outros devedores (art. 4.º da Lei de Introdução; art. 8.º da CLT), pois não há norma específica tratando do tema para outros executados, visando que se tenha o mesmo resultado e não se faça distinção entre os clubes e outro empregador.

É o meio de os credores receberem o que lhes é devido e o devedor ter forma parcelada de pagar o que deve. Envolve, portanto, o binômio necessidade no recebimento dos créditos e a possibilidade do seu pagamento pelos devedores (§1.º do art. 1.694 do Código Civil), mas observa-se também o princípio da proporcionalidade.

O plano de pagamento aos credores em relação aos clubes de futebol é de seis anos (art. 16 da Lei n.º 14.193/21). Esse prazo se justifica se a dívida tem um valor considerável. Entretanto, pode ser um prazo muito longo se o valor da dívida é menor e há capacidade de pagamento do empregador.

Em razão de que o artigo 15 da Lei n.º 14.193/21 estabelece o prazo de seis anos para o cumprimento do pagamento dos credores, o citado artigo é aplicável aos casos que estão em curso.

Se o clube descumprir a previsão da Lei n.º 14.193/21 ou do plano de concentração, perde os benefícios estabelecidos e retorna a execução individual de cada crédito.

A Associação Portuguesa de Desportos teve uma concentração de execuções feita entre 2007 e 2008. Na época, não existia exatamente uma norma tratando do tema. Existia um Juízo Auxiliar de Conciliação. Nesse juízo, só em 2007, nas 65 audiências promovidas, foram fechados 37 acordos. Não cumpriu a Portuguesa com os pagamentos e a reunião de execuções foi cancelada. Tinha 261 processos, com dívida de R$ 170 milhões, em janeiro de 2021. A Portuguesa tinha 1.000 funcionários antes da pandemia. Hoje, tem 100 empregados. Houve diminuição de pagamento de valores de aluguel de dois imóveis.

A festa junina não foi feita em 2020 e 2021, que tinha um rendimento de por volta de R$ 1.400.000,00 em cada festa. Não há rendas das partidas desportivas. O clube destina mensalmente à reunião de execuções 30% do seu faturamento ou no mínimo R$ 250.000,00 por mês. Como garantia, foi dado o estádio do Canindé. No mês de abril de 2021 foram homologadas 24 conciliações, que totalizaram R$ 683.196,75. No mês de maio foi feito um acordo em audiência telepresencial de um processo de R$ 50 mil por R$ 26.800,00, em que o jogador estava jogando no Cazaquistão, com diferença de fuso horário de 9 horas. Em 31 de maio foram feitos mais três acordos de quatro processos. Com os novos depósitos mensais, o plano prosseguirá chamando credores que tenham interesse na celebração de acordos. Foi feito acordo no processo em que havia a penhora dos principais troféus da Portuguesa e estavam com o leiloeiro. Agora, eles retornam à posse da Portuguesa. Já foram feitos acordos e pagamentos em 70 processos em oito meses.

O Órgão Gestor de Mão de Obra (OGMO) do porto de Santos fez acordos no valor de R$ 2,6 milhões no início de 2021. Houve pagamentos a 420 trabalhadores, que aguardavam pagamento há mais de dez anos. O OGMO vem disponibilizando cerca de R$ 517 mil todo mês exclusivamente para acordos.

Um trabalhador aguardava por 13 anos para receber seu crédito. Foi feito acordo para receber R$ 1,1 milhão. Foi fechado outro acordo de R$ 115 mil após 10 anos. Um total de 400 trabalhadores, representados pelo Sindicato dos Conferentes de Carga, Descarga e Capatazia do Porto de Santos, São Vicente, Guarujá, Cubatão e São Sebastião recebeu o montante de R$ 450 mil, em razão do acordo. Já foram feitos acordos que beneficiam 500 reclamantes, totalizando R$ 5,9 milhões.

A utilização da concentração de execuções tem dado bons resultados para o recebimento de créditos de trabalhadores que esperavam por longos anos para serem solvidos. É uma forma de tornar eficaz a sentença que transitou em julgado.

Parece que com os parâmetros definidos na Lei nº 14.193/21 há maior segurança jurídica para a concentração de execuções, pois agora há fundamentos previstos em lei em relação a procedimentos nela descritos.

*Desembargador Corregedor do TRT da 2ª Região

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