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Governo Doria quer terceirizar merenda das escolas em São Paulo

Por Thaiza Pauluze (Folhapress)

A Secretaria da Educação de São Paulo, sob gestão de João Doria (PSDB), quer terceirizar a merenda das escolas estaduais, desde a compra e distribuição até toda a mão de obra envolvida no preparo dos alimentos. Para receber a comida, os alunos passarão a apresentar uma carteirinha com QR code, um código digital. 

A pasta, comandada por Rossieli Soares, vai fazer uma audiência pública na manhã desta terça-feira (22), com a presença do secretário, para discutir a viabilidade de contratar uma empresa para prestar "serviço de gestão da alimentação escolar". 

A convocação foi publicada no Diário Oficial do Estado no dia 15 de outubro.

O documento base para contratação prevê que a empresa elabore novos cardápios, priorizando alimentos in natura, e cuide da aquisição dos itens, da logística de distribuição, armazenamento, higienização, e do preparo.

Além disso, também ficará responsável pela manutenção e aquisição de equipamentos e utensílios, adequação das cozinhas, dedetização e por fornecer mão de obra para preparação dos itens (merendeiras) e para limpeza das cozinhas e despensas (faxineiras). 

Parte dos serviços poderão ser subcontratados e será possível acrescer ou reduzir a quantidade dos alimentos, sem alteração do preço unitário -observado limite.

A empresa deverá instalar duas câmeras em cada escola: uma dentro da cozinha e outra no local de entrega da merenda aos alunos. As imagens devem ficar armazenadas por ao menos seis meses.

A outra forma de controle da merenda será via carteirinha (impressa ou no celular) com QR code. Os alunos receberão o documento, que deverá ser apresentado para leitura óptica em dois momentos.

Primeiro, quando chegarem à escola, os estudantes terão acesso ao cardápio do dia e terão que decidir se vão comer ou não e apresentar a carteirinha ao fiscal. Após a entrada de todos do turno, o sistema de solicitação será fechado. A ideia é medir qual quantidade de refeições e lanches devem ser preparadas. Na hora de pegar a merenda, o aluno deve apresentar a carteirinha de novo. 

O contrato de terceirização terá vigência de 30 meses, podendo ser prorrogado. Não há, no texto, a previsão do preço unitário de cada refeição. A rede estadual tem 5.500 escolas, com 3,5 milhões de alunos, e oferece 3 milhões de refeições por dia (parte dos alunos não come a merenda -ou traz de casa ou compra na cantina).

Em 2018, o governo do estado gastou R$ 881 milhões com a alimentação escolar.

Hoje, a secretaria da Educação centraliza metade da compra e entrega de alimentos da rede. Funciona assim: a pasta é encarregada de comprar cada um dos itens, por meio de licitação, e distribuir 1,5 milhão de refeições para 120 municípios.

O gasto é de R$ 2,58 por dia com cada aluno. Em 2018, foram gastos R$ 262 milhões com a compra de alimentos –83% com verba federal- e R$ 339 milhões com logística.

A outra metade é servida por 525 municípios paulistas, por meio de convênios. Ou seja, a secretaria repassa a verba e a gestão municipal se encarrega da compra e distribuição da merenda.

Com os convênios, foram gastos R$ 280 milhões no ano passado. Cada aluno, por dia, custou R$ 1,30, sendo parte (R$ 0,94) paga pelo governo do estado e o restante vindo dos cofres federais. Os municípios acrescentam mais um valor, que varia.

Nesse modelo, a secretaria vê como desafios a fiscalização da qualidade das refeições e a prestação de contas. No primeiro, os imbróglios são com a distribuição e o gerenciamento dos contratos com fornecedores.

Parte das merendeiras já são terceirizadas. Segundo a própria secretaria, merendeiras concursadas já são uma espécie em extinção no estado, mas, questionada, a pasta não respondeu qual percentual as terceirizadas representam do total.

A Secretaria da Educação afirmou que a audiência pública tem como objetivo ouvir a sociedade e buscar contribuições "para posteriormente, se julgar pertinente, adotar alterações no modelo existente". Ainda segundo a pasta, não existe nenhuma definição adotada por ora.

Merenda polêmica A gestão Doria já foi alvo de polêmicas envolvendo merenda escolar. Em 2017, quando estava na prefeitura, o tucano defendeu a adoção no cardápio dos alunos de uma farinha preparada com uma combinação de alimentos, a farinata -após as críticas, ele voltou atrás.

Neste ano, com Doria no governo do estado, a secretaria da Educação firmou contrato de fornecimento de carne para merenda com três frigoríficos que tiveram atividades suspensas pelo Ministério da Agricultura.

Após a Folha relevar o certame, a pasta demitiu três funcionários. Mas, sem punição, um dos frigoríficos autuados voltou a ganhar licitações.

Para cuidar do programa de alimentação das escolas, a gestão trouxe a nutricionista Vanessa Alves Vieira, exonerada após suspeita de envolvimento na chamada máfia da merenda.

Ela assumiu o mesmo cargo que tinha à época, mas não foi nomeada em Diário Oficial -uma irregularidade.

Se multiplicam ainda relatos de falta de itens da merenda e de funcionárias para prepara-las. 

Em outubro, uma escola estadual na Vila Esperança, na zona leste da capital, passou a pedir aos alunos que levassem alimentos de casa para complementar as refeições. A escassez é principalmente de temperos, como sal, alho e cebola. 

Na zona sul, a falta é de merendeiras. Por lá, os alunos passaram a receber alimentos secos, ou seja, leite em caixinha e bolacha de água e sal.

TERCEIRIZAÇÃO NO ALVO
Em maio do ano passado, a Polícia Federal deflagrou a Operação Prato Feito para apurar desvios de recursos federais para a merenda, uniformes e material didático em pelo menos 30 municípios do estado de São Paulo.

De acordo com as investigações, prefeitos eram procurados por lobistas em época de campanhas eleitorais com propostas de financiamento em troca da terceirização da merenda escolar.

Após a terceirização, as empresas, que formavam um quartel, estipulavam os valores dos lances e quem venceria cada licitação. Elas garantiam que as outras na disputa não venceriam com pagamento de propinas para que os contratos tivessem cláusulas que direcionassem o certame.

Em setembro deste ano, 96 pessoas foram indiciadas pela PF, entre prefeitos, empresários e servidores. Foram devassados 65 contratos, cujos valores totais ultrapassavam R$ 1,6 bilhão.

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