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ENTREVISTA | ‘Sou extremamente focado na missão’

José Luís Zamith fala sobre o Pacto RJ, sua vida na Marinha e como migrou para a gestão pública 

Fuzileiro, professor e um dos grandes articuladores de grandes projetos de incentivo à retomada da economia do estado do Rio de Janeiro. O Correio da Manhã entrevista nesta semana o secretário de Estado de Planejamento e Gestão do Rio, José Luís Cardoso Zamith, que falará sobre sua vida na Marinha, no funcionalismo privado e no setor público.

Cláudio Magnavita: Você, com 49 anos, ainda está na turma que batizei de “os Quarentinhas”, uma geração na faixa de 40 anos responsável por esse processo de tentar colocar o Rio nos trilhos. Você já foi secretário também da Casa Civil do governo Witzel e saiu. Aliás, quando saiu, disseram que foi o começo do fim daquele governo. Como é fazer parte dos Quarentinhas?

José Luís Zamith: Eu não vejo pela idade, vejo pelo vigor, pela vontade e disposição de tentar ajudar. Entrei na vida pública, aliás, voltei à vida pública, porque estive há um tempo na Marinha, exatamente pela vontade de tentar me doar um pouco, trazer a minha experiência, a minha formação, tudo aquilo que eu passei pela minha vida. Sai da zona de conforto, onde a gente fica só reclamando pelo “zap”, para contribuir de alguma forma. Por isso me enquadro no time do Cláudio como um Quarentinha com vigor para ajudar.

CM: Tem que ter 48 horas para trabalhar no governo. Não dá para ter uma vida normal e a família é penalizada por isso, certo?

JLZ: Muito, a minha família sofre e já se adaptou um pouco. Principalmente quando a gente está lá e não está. A pior coisa que pode acontecer na vida pública é você não parar, não ter momentos de break. Às vezes estou lá, conversando e minha filha olha para mim e diz “pai, você não ouviu absolutamente nada do que eu falei”. Eu digo “desculpa”, e não tem desculpa.

CM: Quero pegar esse lado humano. Você fez uma surpresa na primeira grande reunião de secretariado ao pegar mensagens de familiares e montar um vídeo sem que ninguém soubesse, exceto o ex-chefe de polícia, o secretário da Polícia Militar. Foram depoimentos emocionados de familiares, mostrando que eles entendiam e aceitavam a dedicação de seus líderes.

JLZ: Na verdade, eu também não sabia.

CM: Você não tinha dado a ideia?

JLZ: Não, eu tinha feito do dia dos pais da minha secretaria. Peguei as famílias para mostrar que a gente não tem desassociação. E vou falar uma coisa, o que mais me assustou quando eu voltei para vida pública foi a dimensão da pessoa José Luís nos seus próximos e familiares. Aquilo para mim foi um choque. No fim das contas você vê a pessoa que me conhece assim: “Joguei bola e vôlei com o Zé, e hoje ele é secretário”. Minha mãe tem na sala dela a minha indicação como chefe da transição, então, isso dá uma dimensão para gente como pessoa e uma responsabilidade gigante. Isso eu tento transferir para minha secretaria diariamente. Mas eu fiquei surpreendido ao ver minha filha falando...

CM: Você também chorou...

JLZ: Chorei... não esperava minha filha.

CM: Voltando a essa questão, você escreveu um artigo para o jornal Correio da Manhã falando da honra de ser servidor, questionando, inclusive, essa questão da vitrine que leva quem tenta fazer um trabalho série se misturar com os outros. Não se consegue desassociar o joio do trigo?

JLZ: A gente jogou todo gestor público no mesmo saco. Hoje não se difere o joio do trigo. Isso para gestão pública é a pior coisa que pode acontecer. Não existe democracia sem político e não existe administração sem gestor. Quando você coloca todo mundo no mesmo saco, você não cobra, porque você espera daquele cara o pior possível. No final das contas, a gente sai do ciclo vicioso.

CM: A mídia contribui para isso, certo?

JLZ: Completamente, a mídia é a grande responsável.

CM: A demonização do servidor público?

JLZ: E do político.

CM: Sou filho de servidores públicos.

JLZ: Eu também.

CM: Meu pai foi funcionário de carreira do ministério da Educação e de Cultura na época. Galgou vários cargos até chegar a delegado regional, que era o maior cargo que tinha na Bahia. Reitor, diretor geral do Centro de Educação Tecnológica. E eu, garoto, ia ao gabinete dele quando saia do colégio. E tinha orgulho de ser servidor público. Você acha que isso deixou de existir?

JLZ: Acho que existem dois motivos: um exógeno e um endógeno. O exógeno é essa situação que a gente está vivendo hoje da globalização, onde empregador e sua organização deixaram de ter um vínculo e passaram a estar vinculados a dinheiro, exclusivamente.

CM: Vamos pegar um pouco o exemplo oriental, onde ele entra em uma empresa e quer envelhecer nela. Isso deixou de existir?

JLZ: Está cada vez menor, pela quantidade de massa de manobra e pressão dos custos. Quando há pressão de custos, é assim: “Você consegue fazer isso por um valor menor?”, “”consigo”, porque então não trocar?

CM: Não entende que se trabalha com pessoas e o aspecto motivacional vai embora. O problema do funcionário é um problema dele e a empresa não tem nada a ver.

JLZ: A recompensa é estritamente financeira. Agora, do ponto de vista endógeno, é uma questão muito de país. Eu, por ser militar, uma coisa que trabalhamos durante quatro anos, é trabalhar valores. Minha mãe é professora, foi do município, estado, diretora de colégio... Lembro de ir para o colégio dela em Bento Ribeiro, participando de formaturas, e aquela ligação dela com a escola. Para mim é uma ligação que é minha também. O colégio estadual José Aciolly. Também da mesma forma, em relação ao servidor público, ficou muito pautada no corporativismo de carreira e na grana.

CM: Você me deu agora uma bolinha para falar da questão do inativo. Nós percebemos que o poder público trata o inativo como um problema. Como você vê essa demonização do aposentado?

JLZ: Faz parte desse movimento que a gente vê da parte cultural. Está se gerando uma mentalidade de que o inativo é apenas custo.

CM: Sua mãe se aposentou.

JLZ: Sim, pelo município, depois pelo estado, ela fez concurso depois para fiscal. Ela dedicou a vida inteira para servir e poderia estar mais. Ela se queixa, aos 79 anos, de estar em casa.

CM: Qual o nome dela?

JLZ: Dilma

CM: A minha também. Essa eu confesso que eu não sabia, mesmo sendo muito amigo do Zamith. Uma feliz coincidência. Quero entrar agora na questão do gestor motivacional, pois faz um trabalho na Secretaria de Planejamento com muitos diálogos com os funcionários. Você não acha que está na hora de tal modelo ir para as outras classes?

JLZ: Não posso afirmar algo assim porque não me considero um exemplo. Não tenho esse tipo de ingerência. Na verdade, não faço gestão motivacional, eu tento liderar. E liderança é algo que aprendi desde o dia que eu nasci. Meu pai era militar, meu avô e meu bisavô também eram, e uma coisa que eu aprendi é que você não pode levar uma pessoa para tomar tiro com você se você manda, mas sim convencê-la. Para mim, liderar é isso, convencer e conduzir as pessoas.

CM: Então você criou um alimento motivacional, porque as pessoas passam a ter no que acreditar e seguem o líder, criando uma relação produtiva natural?

JLZ: Isso é consequência da liderança, exatamente isso que eu faço diariamente de algumas maneiras. A primeira é ter um time de excelência como você disse, escolher pessoas que têm capacidade.

CM: A maioria é mulher. Você prefere trabalhar com mulheres ou é coincidência?

JLZ: Na verdade, não tem uma maioria de mulheres. Uma coisa que sempre me preocupo é em relação a diversidade, metade dos funcionários são mulheres, metade de homens e todos com os perfis completamente diferentes.

CM: Você tem uma Janine que é fantástica, a Bia que também estava na sua equipe. Ter esse sentimento de corpo, de você ter uma equipe, isso também é muito bom quando ocorre no serviço público. O Estado se beneficia disso não acha?

LZ: Totalmente porque no fim das contas você consegue tirar o servidor da zona de conforto. Eu fiz uma pesquisa de satisfação há cerca de dois meses atrás e foi impressionante o nível de integração, diálogo e felicidade de todos com a chefia, chegou a 80% de 427 funcionários.

CM: Seu pai e avô eram militares. Havia outra carreira para você sem ser militar? Apesar de você ter criado um viés diferente, seu pai era do Exército e você foi para a Marinha. Como você foi para lá?

JLZ: Para começar, em momento algum eu pensei em ser militar. Eu decidi aos 45 minutos do segundo tempo. Pouca gente sabe disso, mas eu estudava no Colégio São Bento, eu tinha um amigo de uma série acima que hoje é juiz, chamado Dr Marcelo Rubioli, que era muito amigo meu. Nós chegávamos mais cedo no colégio. Um dia, ele voltou das férias com o cabelo reco e contou que havia feito uma viagem pela Marinha de alguns meses para resolver as questões do serviço militar. Me interessei, porque meu pai sempre dizia que ele não iria me tirar do serviço militar. Meu caminho era fazer engenharia na UFRJ. Então fui ao meu avô, que tinha mais de 90 anos na época, general do Exército, e disse a ele o que eu queria. Ele, então, me aconselhou a fazer as provas para as academias. Eu vi no calendário que as provas eram agosto e setembro e da UFRJ era só em 5 janeiro. Como usava óculos, descartei a Força Aérea, fiquei entre a AMAM e a Escola Naval. Mas com um detalhe, eu tinha ainda finalizado os estudos necessários, então fui fazer as provas sem saber de fato toda a matéria. Fiz a prova para a Marinha sabendo que teria que acertar pelo menos 50% das questões de matemática. De 25 acertei 12. Segui então na Marinha, mas também fiz a prova do Exército, passei também. Quando estava estudando para as provas finais, recebi uma ligação da Escola Naval dizendo que eu passei e que teria que levar os documentos no mesmo dia e que as aulas começariam dia 3 de janeiro. Pensei e resolvi ir, caso não gostasse, voltaria a tempo de fazer o vestibular. Acabei ficando por 17 anos (risos).

CM: Você ia entregar o bastão de comando do seu pai para o Bolsonaro, mas sua filha não deixou. Conta isso.

JLZ: O meu pai foi uma pessoa que se dedicou ao Exército e a minha família sempre foi linha dura. Meu pai foi comandante da Polícia do Exército, foi o comandante mais longínquo. Ele sempre foi um exemplo de dedicação e pensamento no Exército. Tanto que meu pai foi pra reserva muito cedo porque ele disse que não ia ser promovido por determinado presidente. Meu pai sempre foi um exemplo daqueles que carregavam o piano. A geração dos anos 70, que é a geração do Bolsonaro, conhecia o meu pai.

CM: Mas me conta do bastão.

JLZ: Então, o que aconteceu. O meu pai, quando faleceu, eu tinha o bastão dele guardado e quando eu soube que eu teria um encontro com o presidente e ele tinha meu pai como exemplo, eu mandei reformar o bastão e eu iria até Brasília dar de presente para ele. Só que ele veio para cá, no dia que eu fui convidado para encontrar ele, eu disse em casa que estava levando o bastão. Então minha filha me proibiu, disse que o bastão era da minha família, que meu pai havia dado a ela e que o bastão não sairia da minha casa (risos).

CM: Em casa nunca houve problema em você ser da Marinha e ele do Exército?

JLZ: Não, eu tenho um irmão que é coronel do Exército e eu sempre fui uma pessoa muito apoiada na minha mãe e nunca fui muito de perguntar para ter minhas decisões, porque eu sempre fui muito independente nas minhas direções.

CM: Como você, com um pai linha dura, conseguia ficar embaixo da asa da mãe?

JLZ: Exatamente por ele ser linha dura que ficava com a minha mãe, porque ela bancava as coisas que eu decidia. Ele, em casa, orientava, mas como sempre tive boas notas e sempre fui muito independente, eu comunicava minhas decisões. Quando disse que iria para a Escola Naval, ele respondeu para eu ser o melhor oficial da Marinha.

CM: Qual atitude você acha que seu pai teria ao ver nomes das Forças Armadas de volta ao comando do país?

JLZ: Uma coisa que meu pai sempre gostou foi de História, porque ele contava a influência de determinadas pessoas na história, dentro das decisões do país. E uma das coisas que mais o incomodava é a forma de como as Forças Armadas saíram da história do país, pois ele sempre pensou pelo Brasil.

CM: Você acha que se fosse o Geisel, e não o Figueiredo, as Forças Armadas não iriam sair pela porta da frente, e não pela dos fundos?

JLZ: Não tenho capacidade para afirmar isso, ainda mais porque, quando ouvia o meu pai falar do Figueiredo, comentava sobre a família, pois era muito ligado a eles. O meu pai trabalhou com o João no Serviço de Inteligência do Comando Militar do Leste, no Palácio Duque de Caxias.

CM: Você não acha que esse “demonização” ao presidente Bolsonaro não está passando dos limites?

LZ: Nada é por acaso. A partir do momento em que ele começou a questionar o status quo, ele está sofrendo as consequências. É um absurdo o que estão fazendo com ele, porque uma coisa é você mostrar, como imprensa, as coisas ruins, mas tudo ser ruim e partir para o lado pessoal...

CM: Nós estamos há três anos sem nenhum escândalo de corrupção, e essa CPI, onde os agentes, eu diria até ilegítimos na questão de bastão da moralidade, é só olhar o currículo do Renan Calheiros e do Omar Aziz, que eles não têm a estatura moral para falar o que falam.

JLZ: Eu vou voltar à figura do presidente Bolsonaro, pois estão retirando as falas dele de contexto. Isso, para nós, que somos agentes públicos, não tem algo mais difícil do que sentar à frente de jornalistas e falar aquilo que é necessário que a população saiba. E o que fazem com ele é pegar frases fora do contexto e transformar isso em crise o tempo todo. No mínimo, é um ato falho.

CM: Qual foi a maior contribuição que a Marinha trouxe para a sua pessoa?

JLZ: Que eu tenho que alimentar a pessoa que trabalha comigo diariamente. Não há como relaxar em nenhum momento enquanto pessoas trabalham embaixo de mim.

CM: Conta um pouco sua trajetória na Marinha e o termo Adsumus.

JLZ: Eu sou fuzileiro e Adsumus é uma palavra em latim que significa “aqui estamos” e que é o lema dos fuzileiros. Como já dizia Clarice Lispector, “enquanto houver os soldados do mundo, que fique aquilo de mais bonito, que são os fuzileiros navais”. Eu saio da Escola Naval e faço minha viagem de ouro em 1994. Voltei como fuzileiro e escolhi a artilharia como minha arma. Servi por três anos o Batalhão de Artilharia e tomei a decisão de ir para o fora de sede, onde fui morar em Rio Grande (RS), a penúltima cidade do Brasil. Eu também fiquei três anos em Rio Grande e tomei a decisão de voltar porque o militar tem uma característica de não parar de estudar. Ele tem cursos de carreira que o habilitam a seguir os postos acima. Então, além da meritocracia, você tem que estar qualificado para estar apto a ser escolhido. Eu fiz o curso de carreira, voltei para o meu Batalhão de Artilharia e fui selecionado para ser um dos oficiais comandantes de companhia na formação dos aspirantes da Escola Naval. Eu era o único fuzileiro naval, capitão-tenente, dentro de seis companhias que cuidavam do corpo de aspirantes. Passei dois anos como comandante de companhia e apareceu a oportunidade de fazer o mestrado em Administração. Eu escolhi e fui recomendado por empenho, porque já tinha feito, anteriormente, uma pós-graduação, fora do expediente, e fui fazer o mestrado por dois anos. Aí eu começo a ter uma visão exterior, porque, ao estar na FGV, eu participei do planejamento do Pan-Americano, como consultor da FGV, e comecei a me relacionar com o mundo exterior. Voltei para a Marinha por mais um ano e meio e o governador Sergio Cabral foi eleito. Na sua eleição, ele fez a transição na FGV e, na época em que estava por lá, estudava segurança pública, e o presidente da FGV me convidou para ser subsecretário de Gestão. Eu aceitei o convite e fiz uma entrevista com o Beltrame, na época. Ele aceitou, mas a Marinha não deixou. Passou dois meses e outro professor disse que o Joaquim Levy estava precisando de um especialista em orçamento e me indicaram. Eu conversei com o Levy e disse que precisava de mim, de um militar para organizar a casa. Eu disse que a Marinha tinha negado me liberar de outro convite e ele disse que iria resolver. Não conseguiu e perguntou se tinha outra forma de me ter. Eu disse que poderia pedir uma licença não-remunerada e você pagaria o meu salário. Quando entrei com o pedido de licença, isso deu uma confusão na Marinha, que não me deu a licença, na época, e voltei a seguir minha carreira. Porém, como tinha feito meu nome no mercado fora, recebi a ligação de um amigo dizendo que uma empresa estava precisando de um gestor. O salário era cinco vezes mais o que ganhava na Marinha. Cheguei para a minha mulher, que era tenente na Aeronáutica, e disse que se tudo desse errado, a gente iria se virar com o salário dela, porque iria pedir as contas. Ela disse ok, mas pediu para falar com o meu pai. Ao falar com o meu pai, disse que pedi demissão. Ele não disse nada e foi para o cantinho dele, com a minha mãe do lado, para ver o que iria acontecer. E assim fui para a Nokia Siemens, morar em São Paulo e seguir minha carreira no setor privado.

CM: Agora, me diz uma coisa sobre seu casamento. Você coloca uma terceira arma na sua vida, que é a Aeronáutica. Marinheiro, com um pai do Exército, casado com uma tenente da Aeronáutica, cocê tem quase um Ministério da Defesa em casa Como você conheceu a sua mulher?

JLZ: Foi o seguinte: eu tinha casado aqui no Rio, fiquei um ano e meio casado, fui pro Sul e me separei. Eu casei muito novo. Aí, eu separei logo depois da viagem, não deu certo. Estava no Sul sozinho, e no meu segundo ano no Sul, você tem aqueles oficiais temporários, que não podem passar de oito anos. Eu a recebi no Sul, como instrutor da formação dela por um mês, só que, como Rio Grande era uma cidade muito pequenininha e a gente tinha mais ou menos a mesma idade, a gente passou a sair juntos o tempo todo. A gente passava os fins de semana juntos. E aí, nessa a gente acabou ficando junto. No ano seguinte, ela saiu da Marinha, foi fazer mestrado em Porto Alegre, eu passei a fazer uma maluquice que, graças a Deus, não morri. Porque era assim, eu pegava 300 quilômetros pra ir pra Porto Alegre ou pegava 400 quilômetros pra pegá-la em Porto Alegre e ir pra Caxias. Nós ficamos fazendo isso durante um ano, eu tinha que voltar no fim daquele ano, então decidimos casar.

CM: Ela é médica?

LZ: Ela é farmacêutica. E você quer uma curiosidade? Nós nos casamos em 9 de outubro de 1999. A minha filha nasceu cinco anos depois, em 9 de outubro de 2004.

CM: Estava programado. Já que estamos num clima mais informal relacionado à família, você tomou um susto relacionado à saúde, certo?

JLZ: Foi o seguinte. Eu estou contando aqui um monte de coisas que eu contei para poucas pessoas. Quando eu assumi a transição, basicamente é uma loucura em que você já emenda como Casa Civil. Eu comecei a me sentir muito mal, a ter problemas de saúde que eu não imaginava que fosse ter na Civil, e tinha tomado a decisão de que não continuaria ao final daquele ano. Eu tive uma crise de cansaço muito grande no carnvaval. Eu já era hipertenso e piorou. Quando chegou em julho, comecei a ficar pior ainda e investigar. Só que, por conta da Casa Civil, você vai jogando pra frente. Aí, em setembro, teve aquele movimento do ex-governador de me oferecer uma outra secretaria, então eu tomei a decisão de antecipar a minha saída. Eu agradeci e disse que não queria mais continuar, porque eu não queria continuar mesmo naquela gestão, mas, ao mesmo tempo, foi um passaporte pra eu sair.

CM: Você deve prestar mais atenção em si.

JLZ: Eu fui fazer um exame de carótida. Nesse exame, eu descobri que tava com um tumor na tireoide extremamente agressivo, e que se eu tivesse atrasado seis meses, eu tinha morrido. Isso foi uma revolução dentro de casa, a gente tava com viagem marcada…

CM: Sua esposa, com conhecimento científico, como farmacêutica?

JLZ: Foi um amigo dela que descobriu. E a gente tava com viagem marcada, porque a minha filha faria 15 anos, e nós íamos pra Austrália. Eu saí e entrei pra fazer esse grupo, porque elas iam viajar e eu ia ficar, e aí suspendi a viagem de todo mundo, tomei um susto muito grande. Até porque, né? Era um tumor…

CM: Como dona Dilma ficou nesse momento?

JLZ: Ela ficou tonta e a gente foi descobrindo aos pouquinhos o nível da gravidade.

CM: Então, quer dizer que, se você continuasse no governo, na Casa Civil, naquela loucura, você teria…

JLZ: O tumor teria ido pra medula, eu começaria a ter incômodos na cervical e aí não teria jeito.

CM: O que muda na cabeça da pessoa ao ter um baque desses com 40 e poucos?

JLZ: O primeiro é que você vê a possibilidade de morrer, então tudo aquilo que você planejou deixa de ter importância. O importante é você ter o entendimento do que vai acontecer. O segundo é ter uma filha e uma mulher que você se questiona: “o que vai acontecer com elas?”. Não sei, eu não estava preparado para aquilo. E o terceiro ponto é perceber o quanto eu estava afastado, estava ligado em coisas mundanas, e watava afastado da minha formação, que foi religiosa, no Colégio São Bento, e que é preciso ter Deus perto da gente. E a partir daí, por exemplo, eu mudei. Eu vou a missa todos os domingos, faço minhas orações diariamente…

CM: Muda a escada de valores?

LZ: Completamente.

CM: Guardando as devidas proporções, quem passou pela Covid parou para pensar na vida também?

JLZ: E é engraçado que essas pessoas que passaram depois de mim tiveram um relato muito parecido com o meu quando saíram. De perceber o quanto a gente tá distante de Deus e o quanto a gente é frágil. A gente não é nada.

CM: Na Casa Civil, você seguiu um pouco a linha dura do seu pai. Agora, as pessoas, as vezes, se surpreendem, pois o veem mais tolerante. O que mudou depois disso?

JLZ: Na verdade, como pessoa, não mudei. A função é que mudou e, naquela época, a função precisava daquilo ali. O Zé Luiz de hoje é o Zé Luiz de ontem. As pessoas que me conhecem de criança sabem que eu sempre fui aquilo. Agora, o que mudou pra mim é que eu consigo colocar o trabalho no lugar dele. Eu cuido da minha saúde.

CM: Agora, questão de amizade. Sua relação de amizade tem muito a ver com sua formação militar, pois são amigos para vida toda.

JLZ: Olha, eu conto pra você que hoje eu fui convidado a ir no Batalhão Toneleiro, pelas Operações Especiais. E é engraçado que você revê pessoas que mesmo que não sejam do seu convívio, a formação é a mesma, os valores são os mesmos, o ambiente de camaradagem. E isso faz toda a diferença. Eu sinto muita falta.

CM: Vamos falar agora do governo. Eu queria mergulhar um pouco no dia a dia. Como você define o governador Cláudio Castro?

JLZ: Um político pacificador. O que o Cláudio Castro conseguiu fazer no quebra-cabeças que ele recebeu e na confusão que ele recebeu, conseguir conciliar todos os interesses envolvidos, e, mais do que isso, fazer com que os interesses da população fossem atendidos… Congregar isso tudo, convergir isso tudo, pra esse mesmo interesse é muito difícil pra quem não vive o dia a dia entender o tamanho da conquista que ele alcançou.

CM: Comenta um pouco sobre o Pacto RJ?

JLZ: O que aconteceu é que dentro desse planejamento que o governador Cláudio Castro se colocou, ele percebeu que ele precisava convergir a administração pra um ponto só. Aí, ele convocou a criação do pacto e colocou a gente pra desenvolver esse plano. Na época, o secretário Rodrigo Babenco percebeu e assessorou dizendo o seguinte: “Cláudio, a gente precisa trazer todo mundo pra um norte único. Bota o Zamith pra tocar e planejar isso”. Aí, a gente colocou método, eu coloquei meu pitbull, Geninho Domenec, pra ser secretário-executivo, da mesma forma que a Pia fez na transição, a gente botou a metodologia que a gente aprendeu lá na transição, que deu certo, fizemos a mesma coisa e colocamos velocidade naquilo ali. E agora o pacto está de pé.

CM: Agora, você está fazendo uma coisa extraordinária, que é a medição social e os reflexos que o pacto no Rio de amanhã. Fala sobre isso.

JLZ: Esse é o meu propósito pro ano que vem. Na verdade, a gente tem, até de um método conceitual, três tipos de indicadores. Os quantitativos, que são aqueles que a gente consegue mensurar, como as estatíticas de criminalidade, os indicadores meio,que são aqueles do avançar dos projetos, mas a gente precisa dos indicadores qualitativos, que são a percepção da população em relação àquilo que a gente está produzindo. Então, onde é que a gente está trabalhando pro ano que vem? É medir esses três indicadores, fazer um business intelligence por trás disso pra, ao final, trazer pra cada secretário e dizer assim. Vou dar um exemplo prático aqui. “Apesar de você achar que aquela ponte que você construiu foi fantástica, ela não teve impacto absolutamente nenhum. Você fez dentro do cronograma, os indicadores de meio, você fez dentro do orçamento que você tinha, você entregou no prazo, mas a população não tá nem aí. Então, esse tipo de medida não serve. Da próxima vez, vamos pensar numa outra”. E aí é que eu pretendo colocar o projeto que eu tô chamando de CEPAG 2.0, que é começar a colocar um pouco de inteligência em cima desse monitoramento todo.

CM: Pegando essa linha com todo esse impacto da concessão, das áreas da Cedae as pessoas falam muito em venda da Cedae mas a Cedae continua para fornecer as águas para os concessionários novos. Como foi trabalhar nesse processo?

JLZ: Quando cheguei, esse processo estava sendo dividido entre a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e a Sub de Concessões e Parcerias veio pra mim. Tinha um rapaz, um advogado brilhante, chamado Pedro Pamplona, que era um daqueles que estavam fazendo a modelagem, que basicamente era a memória de todo projeto e ai o que aconteceu é que o secretário Nicola muito habilmente percebeu que a dificuldade que tava acontecendo na Sub secretaria de Concessões e Parcerias e a própria Cedae, ele com aquele espírito negociador que ele tem na veia, ele trouxe para debaixo dele.

CM : Ele é um diplomata, certo?

JLZ: É um diplomata, ele é um baita negociador por que ele sabe perceber…

CM: É outro Quarentinha?

JLZ : É, ele sabe perceber os interesses e aonde cada um tem capacidade e fazer com que todos convirjam para o mesmo objetivo.

CM: Agora você tem a figura do Rodrigo Abel, um pensador, um estrategista, um cientista político que sai um pouco do corpo e que pensa no estado como um todo. É importante esse tipo de reflexão dentro de uma instituição pública, não?

JLZ: É porque o que acontece no nosso dia a dia, emergência o tempo todo, se você não sai um pouquinho, olha de cima e começa pensar lá na frente, a gente passa ser pautado basicamente por aquilo que a imprensa diz que a gente tem que fazer, então hoje eu acho que o pacto além de ser um paradigma de planejamento, ele é um paradigma de estratégia que na verdade pegou todo esse sistema e ele o pautou.

CM: A concessão cria uma musculatura financeira, que é invejável. Acho que na transição você não pensava nisso, correto?

JLZ: Ninguém pensou, e se você olhar para a história do Rio de Janeiro, desde a… vou ousar a dizer aqui, desde a fusão, você nunca teve um investimento da ordem que a gente vai ter de uma forma holística, o que eu quero dizer com isso, você teve muito dinheiro que vinha para estrada, para estádio, para uma ponte…Eu não ouso dizer que a gente nunca teve na história do estado.

CM: Agora Zamith, em produção intelectual, cadê seus livros?

JLZ: Eu comecei, eu gosto muito de escrever, agora comecei.

CM: Aliás, quando você estava fora do governo, quero confidenciar no Correio da Manhã uma das lástimas que eu tenho você foi convidado. E que a gente perdeu um grande articulista, porque você deu contribuições de reflexo extraordinários no Correio.

JLZ: Hoje eu não posso colocar opinião, por ser secretário preciso colocar aquilo da minha pasta e fato. Agora estou começando a escrever um livro sobre liderança. A ideia é trabalhar toda essa experiência na construção do pacto, mostrar as dificuldades de um líder de fazer essa negociação entre diversos.

CM: Com cenário multifacetado, porque você tem uma secretaria feita com posições políticas, são pessoas que são diferentes do fuzileiro naval onde você tem uma uniformidade.

JLZ: É porque a gente nasceu na crise, a gente nasceu com um planejamento, saindo de um processo de impeachment e faltando… as pessoas não têm muita noção já que, por exemplo, em 2021 foi um ano que nós tivemos a pandemia. Nós saímos de um orçamento de R$ 80 bilhões, faltando 23…

CM : Agora você entrega uma LOA esse ano que tem sido aplaudida. Explica o que é LOA?

JLZ: Lei Orçamentária Anual, a gente planeja como nós vamos gastar o orçamento do ano seguinte..

CM: E você sai de uma LOA com um déficit de R$ 23 bilhões para uma LOA esse ano com?

LZ: 0 a 0

CM: Explica essa mágica?

JLZ: Nós aprendemos na dificuldade… aprendemos a destinar o orçamento. Primeiro, para onde tinha projeto; segundo, exigir “do governador” que esses projetos acontecessem, que tivessem uma boa relação de custo-benefício e fazer com que o orçamento não ficasse empossado, então a gente dinâmica dentro da administração e ao perceber isso, basicamente nós conseguimos fazer uma redução de custos e na mentalidade das pessoas pedirem aquilo que elas tinham capacidade de fazer. Então, esse planejamento dos custos foi fundamental para que a gente conseguisse segurar o ímpeto da despesa do ponto de vista de receita. Conseguimos trabalhar com a Fazenda, e de uma forma real, o estado está voltando a crescer e não adianta ter esse excesso de conservadorismo por que isso no final nos dificulta na gestão orçamentária. Então de uma forma real, sem ser conservador, liberar o orçamento que vá se realizando desde o início.

CM: Eu gostaria muito de desdobrar isso, mas estamos chegando ao fim da entrevista. É uma praxe aqui terminar com um pingue-pongue. Fuzileiro?

JLZ: Minha vida

CM: Senador Flávio Bolsonaro?

JLZ: Uma pessoa que está sofrendo com injustiças mas defende demasiadamente o Rio e será um dos responsáveis em 2023 de uma ótima gestão da li pra frente.

CM: Legado?

JLZ: Planejamento e gestão.

CM: Confiança?

JLZ: Nas alturas , sempre.

CM: O que significa ser servidor?

JLZ: Servir é se dedicar e não esquecer, por mais que a gente precise de remuneração para trabalhar, se a gente serve, tem alguém que precisa da gente.

CM: Uma fraqueza?

JLZ: Paciência

CM: Um sonho?

JLZ: O meu sonho é voltar para o mercado deixando um legado que não se perca.

CM: Sentimento de missão cumprida, o que é pra você?

JLZ: Encontrar com alguém que já trabalhou comigo e me mostrar para o filho e dizer: este foi o melhor chefe que já tive.

CM : Gratidão?

JLZ: Sem gratidão não se vai a lugar nenhum. Para mim é uma religião.

CM: Dilma?

JLZ: Minha mãe… exemplo de mulher guerreira. Meu pai dedicou a vida ao exército e nos últimos momentos deixou nossa educação na mão da minha mãe, então foi a guerreira que me deu essa educação de hoje.

CM: Prato predileto?

JLZ: Pelo tumor virei vegetariano… batata frita.

CM: Mas tem saudades do churrasco?

JLZ: Sinto mas sou focado, é por saúde!

CM: O amuleto que você andava no peito não funcionou ?

JLZ: Funcionou, aguentou um ano e meio sem covid. Era um amuleto coreano, um produto que eu terminava com a garganta seca que matava o vírus no ambiente. Eu aguentei um ano e meio sem pegar Covid.

CM: E você como pai?

JLZ: Babão pela filha, meu xodó mas não sou fácil com ela não, sou duro.

CM: Animais? Cachorro? Ponto fraco?

JLZ: Sim, um casal de Golden, Espeto e Pipoca, e tenho um livro “11 Filhotes e um Segredo”. Foi a maluquice que fiz de ter filhotes em casa por 8 semanas.

CM: É uma pena que eles crescem né?

JLZ: Faz parte da vida.

CM: Chegamos ao fim, e para finalizar… agora é Zamith por Zamith, como que o Zé é, e o Zamith é?

JLZ: Zé é o tempo todo rindo e se divertindo, uma vez ouvi de uma pessoa que se a gente não se diverte o tempo todo, é por que morreu. Eu sou intenso, estou rindo o tempo todo, altamente comunicativo, sou extremamente focado na missão.

CM: E o Zamith?

JLZ: O Zamith é o Zé. Não tem dois não!?

CM: Gostaria de agradecer, um prazer enorme compartilhar e principalmente mostrar ao nosso leitor que é muito importante ter gente como a gente fazendo o bem para que tenhamos um Rio de Janeiro melhor.

JLZ: Eu agradeço muito a oportunidade, é o que eu sempre digo, a gente não nasce secretário, a gente não nasce. A gente está! E no final das contas, nós temos família, nós temos amigos, nossa temos o nosso dia a dia. Eu adoro andar descalço de chinelo.

CM: Está ótimo, obrigado Zamith.

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