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O amigo capixaba do governador Wilson Witzel

Lucas Tristão, secretário de Desenvolvimento Econômico, demonstra descaso com a lei 

Por Cláudio Magnavita

O mais importante jornal de Vitória publicou com destaque: “Quem é o capixaba, braço direito do governador do Rio?”. A publicação traça o perfil do Lucas Tristão do Carmo, seus ilustre conterrâneo pinçado ao núcleo de poder do segundo maior estado do país, após ter sido coordenador da campanha para o governo de Wilson Witzel.

A nova incursão de Tristão na Cedae (ele tentou ser o presidente e foi barrado pelo Pastor Everaldo no início do governo) com a indicação do neófito Bernardo Sarreta para a Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do Estado do Rio (Agenersa) foi barrada pela Assembleia Legislativa, fazendo o governador recuar e retirar a indicação (leia mais na página 6).

Com esta medida e derrota inédita do governo, o nome de Tristão retornou negativamente à ribalta, sendo colocada uma lupa sobre as atividades do jovem advogado. Na indicação do secretariado, no fim de 2018, foi o único nome que fez chover canivetes sobre o Witzel. Afinal, os dois tinham sido sócios, e o escritório foi usado para justificar a origem de R$ 200 mil gastos pelo candidato na sua campanha.

O fato de Tristão ser o advogado do polêmico Mario Peixoto em vários processos também foi levantado pela mídia. Este passivo foi bancado pelo próprio governador eleito. O seu ex-aluno e sócio tinha o papel de coordenador-geral da campanha, como orgulhosamente colocou no seu currículo Lattes, e cuidou das soluções mais críticas do período de vacas magras do primeiro turno.

A relação era tão íntima que, nos celulares dos fornecedores e colaboradores, o celular de Tristão era salvo como LUCAS/Wilson Witzel. Era conhecido como o Lucas do Witzel. Segundo um participante ativo da campanha, nesta fase de dureza, as soluções coincidentemente surgiam sempre depois dos encontros de Lucas com Mario Peixoto, o mesmo nome que teria intermediado a visita do então juiz federal ao escritório do ex-governador Sérgio Cabral no Leblon, quando foi revelado o seu interesse de disputar o governo o Rio.

 

Sede de poder

Esta rede de ligações delicadas de Lucas Tristão passa por relações discutíveis no ponto de vista ético, mesmo que não traga alguma ilegalidade explícita ou prontamente identificada.

- É quase um fio de navalha, uma linha tênue que separa os dois universos - afirma um procurador da Fazenda Nacional ao ser informado de que Lucas Tristão do Carmo tinha, desde de 2013, como seu sócio no escritório de advocacia o conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) do então Ministério da Fazenda, hoje Economia.

Nomeado por Guido Mantega e depois reconduzido para o mandato de mais três anos (um conselheiro só pode ficar seis anos), Carlos Augusto de Andrade Jeniér figurava e figura como sócio da firma de advocacia de Lucas Tristão, conforme demonstra o registro do CNPJ 12.227.703/0001-38 ou no registro da OAB do Espírito Santo n/101563370737.

Sabem qual é a especialização da firma de advocacia de Tristão e Jeniér? Direito Tributário!

Esta sociedade sofreu em 2018 uma quarta e última alteração dos atos constitutivos, em 26 de fevereiro, deixando de se chamar Tristão Advocacia Tributária e passando a se chamar Tristão do Carmo e Jeniér Advogados Associados.

A mudança de nome coincide com o fim do mandato do sócio no Carf, passando a ter Carlos Augusto Jeniér protagonismo público na sociedade, que até então não o tinha no nome da firma.

 

Sócio administrador

Se ter um sócio conselheiro do Carf não causava constrangimento e seguia uma linha tênue, a manutenção de Lucas Tristão do Carmo como sócio no papel de sócio administrador deixou de ser uma decisão entre sócios e passou a ser um problema no momento em que foi anunciado e nomeado secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico do Rio.

Como na Receita e nos arquivos da OAB/ES ele continua como administrador, passados 13 meses como secretário, ele está infringindo o Artigo 1011, Parágrafo 1º do Código Civil, e o artigo 117, inciso X, da lei 8112 no caso de servidores públicos da ativa, que veta ao servidor público exercer função de sócio administrador. Ele pode ser sócio, mas não pode administrar.

O grande paradoxo é que Tristão é advogado, foi advogado e sócio de um ex-juiz federal e permite que os registros públicos, quando acessados, tragam esta informação.

- Não acredito que uma pessoa do meio jurídico cometa um erro tão primário, é um descaso no trato da coisa pública e privada - afirma um procurador do Estado do Rio.

 

De volta ao Carf

Ter um sócio como conselheiro do Carf deve ter sido benéfico para a firma. Em 19 de maio e em 20 de julho de 2017, é o próprio Lucas Tristão do Carmo que é indicado em dois ofícios assinados pelo seu conterrâneo e então poderoso Antônio Oliveira Santos, presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC), com vários negócios no Espírito Santo e Pernambuco para integrar a lista tríplice de candidatos a ter uma cadeira de conselheiro.

Tristão não emplacou por pouco. A exemplo do seu candidato Bernardo Sarreta para Agenersa, foi rejeitado e fiou fora do Carf.

O sócio do braço direito de Wilson Witzel conseguiu emplacar um alto cargo do governo Bolsonaro: é consultor jurídico da Caixa Econômica e substituto eventual da Diretoria Jurídica (Dijur). Também por ocupar função pública pode ser sócio, porém sem função de administrador. 

 

O outro lado

A assessoria do secretário Lucas Tristão comenta a reportagem sobre sua permanência como administrador da firma jurídica: “Desde que assumiu a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, em janeiro de 2019, o secretário não praticou qualquer ato, administrativo ou judicial, na condição de sócio da Tristão Advocacia, apesar de não haver impedimento legal para sua manutenção no quadro societário. A Alteração do Contrato Social já foi assinada pelo secretário, cabendo ao novo sócio-administrador o seu protocolo perante a OAB/ES, o que já foi, inclusive, cobrado nesta data.”

A assessoria confirma que não houve a alteração nestes meses e que a “cobrança” do novo sócio administrador só ocorreu após o questionamento do CORREIO.

Sobre a relação com Carlos Augusto Jeniér: “O Dr. Carlos Augusto foi professor de Lucas Tristão na Faculdade de Direito. Firmaram sociedade quando ambos residiam em Vitória. Desde a alteração do regimento interno do Carf, com a inclusão do impedimento, o Dr. Carlos Augusto protocolou sua renúncia ao cargo de conselheiro do Carf. Hoje, ambos estão afastados das atividades societárias da Tristão Advocacia. O Dr. Carlos Augusto sempre observou as regras do Carf, não tendo atuado em qualquer feito em que tivesse qualquer tipo de interesse pessoal.”

Curioso é que a relação com Reniér surge com a mesma fórmula de Witzel e Tristão, a de ex-aluno. Os dois se conheceram neste status professor/aluno. À “Gazeta de Vitória”, Tristão chegou a afirmar que Witzel lhe deu nota 1 em uma prova e o ensinou a estudar.

Sobre sua indicação para o Carf, o “secretário desconhece sua indicação pela CNC. No entanto, registra que seria uma honra representar os contribuintes no Carf”. Publicamos os dois ofícios da CNC que compravam que o secretário deve ter “esquecido por um lapso de memória”. A CNC não incluiria um nome de forma leviana sem consultar o interessado. Talvez os ofícios o ajudem a recuperar a lembrança.

Sobre coincidência de endereços: “Durante o exercício de sua advocacia, Tristão atuou conjuntamente a alguns escritórios de advocacia parceiros, sendo o APD um deles. No entanto, o secretário não exerce mais a atividade da advocacia, carreira pela qual possui alto grau de apreço”.

Sobre o sócio do APD Augusto Carlos Lamego Jr, reconhece que em determinado momento no passado tentaram uma parceria que “terminou não muito bem” e desconhecia que o seu endereço estivesse sendo usado indevidamente até hoje.

Sobre a rejeição de Sarreta: “Mantenho relações cordiais com a Alerj, seus respectivos deputados e, principalmente, o presidente da casa, André Ceciliano, a quem tenho em alta estima”.

Segundo a assessoria: “o secretário informa que não desempenha a função de articulador, sendo inócuo conjecturar sobre sua participação direta no relacionamento independente e harmônico que há entre os poderes de maneira que destoe da posição do governo.”

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