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ONU pede fim do “ciclo vicioso de violência letal” após chacina do Jacarezinho

Redação

Em coletiva de imprensa em Genebra, na Suíça, o porta-voz do Escritório da Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Rupert Colville, chamou atenção para a situação caótica enfrentada pelos moradores das comunidades cariocas no dia a dia. Ele solicitou ainda que o Ministério Público realizasse uma investigação independente, prezando pela imparcialidade, sobre a chacina realizada no Jacarezinho durante a operação policial de quinta-feira (6), que resultou cem 25 mortos.

Segundo Colville, o uso da força letal é o último recurso que deve ser utilizado pelo Estado, em caso de ameaça à vida. Ele reforçou também que a violência brutal e desmedida da polícia carioca é um inaceitável costume antigo realizado majoritariamente em bairros pobres, à margem da sociedade e com moradores predominantemente negros.


Confira o discurso na íntegra:

Estamos profundamente consternados com a morte de pelo menos 25 pessoas em uma operação policial no bairro de Jacarezinho, no Rio de Janeiro, ontem (6 de maio). O incidente começou na madrugada de quinta-feira quando, segundo relatos, policiais no solo e em um helicóptero abriram fogo na vizinhança – em uma operação supostamente destinada a enfrentar membros de uma organização criminosa. Pelo menos 25 pessoas teriam sido mortas durante a operação, incluindo um policial. O número exato de pessoas feridas, incluindo transeuntes e pessoas dentro de suas casas, ainda é desconhecido.

Esta parece ter sido a operação mais mortal em mais de uma década no Rio de Janeiro, e reforça uma tendência antiga de uso desnecessário e desproporcional da força pela polícia nos bairros pobres, marginalizados e predominantemente afro-brasileiros do Brasil, conhecidos como favelas. 

É particularmente perturbador que a operação tenha ocorrido apesar de uma decisão do Supremo Tribunal Federal em 2020, restringindo as operações policiais nas favelas do Rio durante a pandemia da COVID-19.

Lembramos às autoridades brasileiras que o uso da força deve ser aplicado somente quando estritamente necessário, e que elas devem sempre respeitar os princípios de legalidade, precaução, necessidade e proporcionalidade. A força letal deve ser usada como último recurso e somente nos casos em que haja uma ameaça iminente à vida ou de ferimentos graves.

Recebemos relatos preocupantes de que, após os acontecimentos, a polícia não tomou medidas para preservar as provas no local, o que poderia dificultar as investigações sobre o resultado trágico desta operação letal. 

Pedimos ao Ministério Público que realize uma investigação independente, completa e imparcial deste incidente, de acordo com as normas internacionais – em particular o Protocolo de Minnesota sobre a investigação de mortes potencialmente ilegais. Isto implica que as autoridades devem garantir a segurança e a proteção das testemunhas e protegê-las contra intimidações e retaliações.

Também instamos para que haja uma discussão ampla e inclusiva no Brasil sobre o atual modelo de policiamento nas favelas, que estão presas em um ciclo vicioso de violência letal, com um impacto dramaticamente crescente nas populações pobres e marginalizadas.

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