Manifesto em defesa da vida

Um grupo de médicos do Recife está fazendo um manifesto em defesa do tratamento precoce pré-hospitalar aos pacientes com coronavírus, para ser entregue às autoridades federais, estaduais e municipais de todo o país. Leia abaixo o documento na íntegra

“MANIFESTO EM DEFESA DA VIDA
TRATAMENTO PRÉ-HOSPITALAR DA COVID19

Vivemos nossa primeira pandemia, esperemos que a única deste século, a COVID-19. O mundo sofre com uma doença nova, altamente contagiosa e de rápida evolução de gravidade, que massacra principalmente, mas não exclusivamente, idosos e doentes crônicos. E obviamente sem tratamentos definitivos estabelecidos, com muitas dúvidas cujas respostas poderão levar anos para serem corretamente respondidas.

O pensamento geral foi que, por se tratar de uma virose, como a influenza, a gripe aviária ou a suína, poderíamos deixar a doença evoluir naturalmente, pois as pessoas deveriam padecer de um estado gripal e depois curar, e só haveria necessidade de tratar aqueles que complicassem e evoluíssem para a forma respiratória grave, como aconteceu nas epidemias de doenças respiratórias virais anteriores.

O foco do tratamento nos diversos países foi, então, inicialmente, a alta complexidade. Intervir apenas nas complicações. E a atenção deveria ser a especializada, voltada apenas para os pacientes que complicassem. Sendo assim, as ações basearam-se na disponibilização de leitos em hospitais: nas enfermarias para os casos moderados, e nas UTIs para os casos graves. As campanhas governamentais foram: “Vá pra casa, fique em casa” e “Venha ao hospital apenas se tiver falta de ar”. No entanto, como as complicações extrapolaram as expectativas, os sistemas de saúde colapsaram em alguns países.

Ocorre que a COVID-19 não foi e não é uma gripe, mas uma doença infecciosa-imunológica-inflamatória-hematológica que pode ser mortal, que quando complica o faz rapidamente, mudando paradigmas. Isso obrigou os países a repensarem suas estratégias de enfrentamento passando o foco para a atenção primária, negligenciada, subvalorizada conforme o entendimento inicial. Era aí que deveria estar a chave do sucesso: tratar precocemente para evitar as formas moderadas e graves.

QUEREMOS TRATAMENTO PRECOCE, NÃO ENTUBAÇÃO PRECOCE

Quais casos leves evoluirão para moderados? Quais moderados evoluirão para graves? Ninguém sabe ainda. Mas o que todos sabem é que tratando precocemente evita-se que os leves progridam para moderados, e os moderados para graves. Está aí a grande solução: o tratamento nas fases iniciais, a prescrição precoce, mesmo a profilaxia, aliada a todos os demais cuidados de reduzir o contágio: afastamento social, uso de EPIs, aumento da higienização e de produtos de limpeza/desinfecção. Ou seja, a Medicina preventiva aliada ao tratamento precoce.

Especialmente quando essa doença grave se espalha de forma incontida nas áreas mais pobres do país, onde, por definição, as casas são aglomeradas, onde as famílias vivem amontoadas em poucos cômodos, onde as comorbidades são mais frequentes e mal tratadas, onde faltam condições básicas de saneamento, água e higiene, onde o isolamento social ou o confinamento de pacientes infectados é impossível. Em Nova York 84% dos pacientes infectados pelo Coronavírus estavam em confinamento.

Essa foi a experiência em países como a Itália, a Espanha, Portugal e a França. Na Índia, o governo estabeleceu o tratamento profilático para os profissionais de saúde.

No Brasil, ainda estamos incrivelmente apegados à ideia equivocada da primeira fase do mundo: resolver com isolamento social e tratamento tardio. Iniciar medicamentos, que o restante do mundo já usa de imediato, só nos pacientes graves. Quando as vidas já estão indo embora. Além de que a opção pelo tratamento mais caro, limitado pela quantidade de leitos e profissionais especializados, é o menos eficaz, menos eficiente, menos resolutivo, e o que mais deixa morrer.

OS GOVERNANTES E SECRETÁRIOS DE SAÚDE SÃO RESPONSÁVEIS POR MORTES EVITÁVEIS

Estados e municípios que ousaram praticar o tratamento precoce estão acumulando resultados muito bons e salvando vidas, a exemplo de Belo Horizonte e Floriano/Piauí. Pois decidiram implementar protocolos de tratamento pré-hospitalar como o preconizado pela Espanha – que já esvaziou seus hospitais.

A discussão sobre terapêutica deve ser médico-científica, realista, focada na vida e na premência do tempo. Pautada pela necessária isenção de qualquer comprometimento ideológico, partidário, pessoal ou interesse alheio.

Por isso, nós, médicos abaixo subscritos, viemos à presença do Presidente da República, do Governador do Estado e do Prefeito do Município, para pedir uma nova forma de enfrentamento da COVID-19. O tratamento pré-hospitalar. Invertendo-se as prioridades, mantendo todos os leitos hospitalares necessários mas voltando o foco fortemente para a atenção primária. Tratando precocemente, acatando protocolos específicos, apoiando os médicos, dando-lhes segurança na prescrição, disponibilizando os medicamentos para toda a população, intervindo junto aos laboratórios para que esses medicamentos não faltem nas farmácias comerciais, instituindo política de redução imediata de preço e abastecimento consoante as necessidades. Se não dá mais para evitar o prejuízo, pelo menos vamos reduzi-lo, e preveni-lo onde ainda não ocorreu. Com custo baixo, eficiência, eficácia e bons resultados! Cuidemos das pessoas como elas merecem.

QUEREMOS REMÉDIOS, E NÃO LEITOS HOSPITALARES!

COVID19 – REMÉDIOS NA MÃO
Distribuição tanto pelo setor público quanto pelo privado suplementar (planos de saúde). Setor público: postos de saúde, policlínicas, UPAS e onde houver atendimento médico; farmácias do SUS; hospitais e unidades do Exército, Marinha e Aeronáutica; farmácias comerciais do programa Farmácia Popular; entrega domiciliar.
Setor privado (a cargo dos mesmos): hospitais e unidades de saúde dos planos de saúde; entrega domiciliar
MEDICAMENTOS A SEREM USADOS: apresentaremos também em formato de anexo proposta de protocolo medicamentoso para uso nas fases iniciais da COVID-19.

Contamos com a sensibilidade e a compreensão sobre a manifestação. Esperando que as mesmas se traduzam em decisão política de implementar uma nova estratégia de enfrentamento à pandemia nos colocamos à inteira disposição para contribuirmos cada vez mais como médicos e cidadãos para o interesse da nossa nação e do nosso país”.