Coluna Magnavita: Os últimos dias da corte witziana

Na iminência de ser indiciado e afastado do governo, Witzel se engasga com sua prepotência

Por Cláudio Magnavita *

O que ocorre com o governador Wilson Witzel é muito parecido com as semanas finais de uma grande novela da inesquecível Janete Clair. Não se podia perder um único capítulo, por correr o risco de não entender o que estava acontecendo. Nunca a imolação pública de um governante gerou tantos fatos e agregou tantos personagens novos (e até ocultos). Para um leigo entender o que está ocorrendo, é uma missão quase impossível.

Do purgatório ao céu

No final semana passado, o enredo teve reviravolta incrível. Witzel, que estava no purgatório com o processo de impeachment chegando ao prazo final para apresentação da defesa, conseguiu uma pequena vitória com o acolhimento da tese de proporcionalidade, na comissão da Alerj, pelo ministro de plantão do STF, Dias Toffoli, que, na prática, fez o jogo voltar a estaca zero.

Dias depois, o MP-RJ entra com ação civil pública contra o tenente-coronel Edmar Santos e sua equipe, e exclui o governador. Manchete do jornal Extra induz o leitor a achar que ele havia sido inocentado.

Witzel pega o link da matéria e comemora nas redes sociais, como estive de mãos limpas. A comemoração irrita a Procuradoria Geral da República e expõe o Ministério Público Estadual. A defesa e auxiliares próximos condenam a comemoração intempestiva.

Do céu para o Inferno

No dia 5 de agosto, a subprocuradora Lindora Araújo peticiona ao ministro Benedito Gonçalves pedindo a liberação do Edmar e trazendo para a PGR a apuração do caso, por envolver o governo em uma organização criminosa, e colocando Witzel no topo da pirâmide.

O governador, ao contestar os argumentos da petição, passa a detonar Lindora para amigos, e dispara seu WhatsApp. Mensagens que foram parar na PGR e no STJ.

Na mesma semana, a fogueira de cisão com a Alerj é reacesa, com a notícia de um esquema de inteligência localizado no Gabinete de Segurança Institucional-GSI de Witzel e a nomeação de um expert de guerra cibernética e criptografia com status de DG.

Na quinta, 6 de agosto, é a vez do MP-RJ emitir nota de esclarecimento, que desautoriza a versão da imprensa que inocentava Witzel.

A pá de cal

No final da tarde do dia 6 de agosto, o ministro Benedito Gonçalves acata os argumentos da subprocuradora geral, Lindora Araujo, e libera da prisão o ex-secretário de Saúde, tenente-coronel Edmar Santos.

Explode a confirmação da existência de uma delação premiada que entrega de bandeja a cabeça do governador e de seus operadores.

A euforia midiática de Witzel se transforma em um tormento. A bipolaridade do governador e a depressão da primeira-dama, Helena Witzel, atinge ponto crítico. A decisão do ministro Benedito e a dura nota do MP-RJ do Rio (que salvou a reputação da instituição) indicando que existem informações complementares concretas, que comprovam o envolvimento do governador.

Na porta do inferno

Mesmo com o apoio de pastores bajuladores e até empregadores, o governador está agora na porta do inferno. São duas opções: ser afastado judicialmente antes mesmo do impeachment ou ser preso. A última hipótese poderá ser eminente, já que a vaga aberta por Edmar poderá ser ocupada pelo chefe da organização. De concreto, é a irreversibilidade da denúncia. Ele deverá ser denunciado.

Os personagens

Além do governador, a unicidade do casal com os contratos firmados por Helena Witzel; o emprego no Partido Social Cristão; a relação com Mario Peixoto (ironicamente apresentado ao governador e a Lucas Tristão pelo atual ocupante da cadeira de Controlador Geral do Estado); a contratação do Iabas; a atuação do patrão Everaldo Pereira na Cedae, Detran e Saúde; a entrega da cabeça do Lucas (que transferiu seu subsecretário, o Mercês, para a Secretário da Fazenda); o surgimento de advogados/amigos, como Antonio Vanderler e Ricarlos Almagro, tornam este coquetel explosivo. E a bomba dos restos a pagar ainda não explodiu.

Os pecados mortais

O governador cometeu pecados mortais para qualquer ser político:

1. Traiu o presidente Jair Bolsonaro já nos seus terceiro mês.

2. Acreditou ser ungindo por Deus e não por eleitores que se revoltaram e se sentiram traídos.

3. Só pensou na Presidência da República e esqueceu de governar. Terceirizou parcialmente o Governo, menos as ações que garantiriam os seus fundos para o sonho presidencial.

4. Aceitou e defendeu na TV o Iabas, como solução para a pandemia, criando um rombo nas finanças do estado.

5. Menosprezou os deputados estaduais, e os seus acordo políticos só visavam a eleição presidencial.

6. Tentou coaptar o Judiciário, empregando filhos e parentes de magistrados.

7. Transformou a advocacia em um negócio milionário para advogados próximos e amigos.

8. Estabeleceu relação íntima com a Refit (Manguinhos) até o último momento, como vetar a PL da Alerj que proibia a refinaria de vender a domicílio. Pediu ao segundo maior devedor do estado para patrocinar o Carnaval, que por tabela bancou o seu camarote.

9. Colocou como seu advogado inicial no STJ o mesmo profissional que atuou para a Refit e para a máfia dos respiradores no Pará.

10. Transformou a Cedae em uma máquina de problemas e foi incapaz de ser eficaz na crise da geosmina. O governo começou a desmontar ali.

Temos hoje um ser político morto. Ele foi capaz de tudo para sobreviver. Sempre esteve um passo atrás.

Já há quem duvide na capacidade de percepção de realidade do ainda governador.

Entrará para a história como um dirigente que superou seus antecessores em todos os itens. A simplicidade de Pezão e a sedução de Cabral foram superados pela sua arrogância e prepotência.

A carga de decepção que Witzel carrega só é proporcional à sua vaidade. Esqueceu de governar e, a duras penas, aprende que deputado não é Jujuba, que Judiciário não tem dono e que eleitor não aceita ser traído.

Voltando ao mundo da dramaturgia da Janete Clair, e do talentoso marido Dias Gomes, a história de WW conseguiu superar vários personagens. Na vida real, Pezão e Cabral, por exemplo, e no mundo das novelas, o inesquecível Odorico Paraguassu, de "O Bem Amado". Quando se inspirarem no ainda governador, a história do "Mal Amado" já estará pronta. 

*Cláudio Magnavita é diretor de redação do Correio da Manhã