Lei do desacato fere a liberdade de expressão, diz Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Por: Fábio Zanini

A CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) afirmou que a lei brasileira de desacato de autoridade se presta a "abusos" como meio de "silenciar ideias e opiniões".

De acordo com a entidade, a regra viola indiretamente a liberdade de expressão por carregar ameaça de multas ou punições contra quem se manifestar em desfavor de funcionários públicos.

A afirmação da Corte foi feita no relatório de admissibilidade de um processo apresentado pela Defensoria Pública da União (DPU), na defesa Daniel Nitzsche Starling. Ele foi preso depois de chamar um agente da Polícia Federal de "vagabundo".

A DPU argumenta que tratar desacato como delito fere a Convenção Americana de Direitos Humanos.

Ao analisar a admissibilidade da reclamação, a CIDH reiterou que, no seu entendimento, a legislação sobre o assunto reprime "um debate que é de vital importância para o efetivo funcionamento das instituições democráticas".

"A aplicação de leis de desacato para proteger a honra de funcionários públicos que atuam em caráter oficial outorga-lhes injustificadamente um direito à proteção do qual não dispõem os demais integrantes da sociedade. Além das restrições diretas, as leis de desacato restringem indiretamente a liberdade de expressão, uma vez que carregam em si a ameaça do encarceramento ou de multas para aqueles que insultarem ou ofenderem um funcionário público", afirma a Corte em seu relatório.

De acordo com o subdefensor Público-Geral, Jair Soares, responsável pelo caso, extinguir o crime de desacato não significa admitir ofensas aos funcionários públicos. "Já há tipificações no ordenamento jurídico que protegem qualquer brasileiro dos crimes contra a honra, como injúria e difamação", argumenta.

A CIDH vai, agora, analisar o mérito da reclamação, ainda sem data que isso ocorra. Caso confirme o entendimento, pode recomendar que o desacato seja excluído da lei.

O crime está previsto no artigo 331 do Código Penal e prevê multa ou prisão de seis meses a dois anos.