Alta dos juros na Europa pode trazer alívio de curto prazo para o euro

Por: Lucas Bombana

O início do processo de aperto monetário pelo BCE (Banco Central Europeu) deve contribuir para trazer algum alívio para a cotação do euro frente ao dólar no curto prazo.

Especialistas de mercado avaliam que o aumento dos rendimentos oferecidos pelos títulos europeus tende a gerar um maior interesse e um consequente aumento do fluxo de capital direcionado à região.

Nesta quinta-feira (21), o BCE elevou a taxa de juros da Europa em 0,50 ponto percentual, de -0,5% para zero, juntando-se a seus pares globais no aumento dos custos de empréstimo. Foi o primeiro aumento de juros pelo banco central da zona do euro em 11 anos.

Após a decisão de política monetária no Velho Continente, o euro operava em leve baixa de 0,15% frente ao dólar por volta das 13h45, cotado a US$ 1,0176.

No dia 12 de julho, a moeda europeia, que vinha ao longo dos últimos meses em uma trajetória de enfraquecimento contra o dólar, atingiu a paridade em relação à divisa americana, algo que não se via desde 2002.

"A partir do momento que o BCE inicia o processo de aumento dos juros para tentar estancar a alta da inflação, isso tende a aliviar um pouco a pressão sobre a moeda, como aconteceu também no Brasil", diz o gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo.

Os analistas de mercado não esperam, contudo, que a moeda única do bloco europeu tenha força para registrar uma forte valorização frente ao dólar a partir de agora.

A expectativa é a de que, com o aumento dos juros pelo BCE, o euro consiga ao menos defender o patamar de paridade de um para um ante a moeda norte-americana, mas sem espaço para ir muito além disso por enquanto, diz Jefferson Rugik, diretor de câmbio da corretora Correparti.

"Não vamos ver o euro voltando a negociar em níveis de US$ 1,10 ou US$ 1,20 no curto prazo", afirma o diretor da Correparti.

Em primeiro lugar, diz Rugik, porque o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos), também está em curso com seu próprio processo de aperto monetário, iniciado até antes do BCE, e provavelmente com mais uma alta de 0,75 ponto na taxa de juros americana no encontro do dia 27 de julho.

Além da disputa com o Banco Central dos EUA para controlar a inflação das respectivas regiões, com o aumento dos custos dos empréstimos e da atratividade dos títulos sob a ótica dos investidores, Galhardo, da Treviso, acrescenta que o processo de aperto nas condições monetárias tem levado a um risco de forte desaceleração da atividade global, com a possibilidade de uma recessão nos mercados desenvolvidos.

E, confirmado o cenário de queda da atividade nas grandes economias globais, prossegue Galhardo, a tendência é a de que o mercado de uma forma geral fuja para os ativos considerados mais seguros, sendo o dólar uma das principais, senão ainda a principal alternativa disponível no leque de opções dos investidores.

O gerente de câmbio da Treviso assinala também que a invasão da Rússia à Ucrânia, que está se estendendo por mais tempo do que o mercado previa inicialmente, aumenta a percepção de risco dos agentes econômicos em relação às oportunidades de investimento no Velho Continente, em comparação ao mercado americano.

Economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini diz que, com o impacto negativo dos conflitos na Ucrânia para a economia do continente europeu, não descarta um cenário em que o euro volte a se enfraquecer frente ao dólar até o final do ano, vindo a testar patamares ao redor de até US$ 0,90 durante os próximos meses.

Agostini afirma que, embora o BCE tenha dado início ao processo de aperto monetário na região, não é somente a atratividade dos juros que faz os investidores se deslocarem para determinado mercado em detrimento ao outro.

A saúde econômica da região em questão é um fator fundamental para definir o fluxo de capitais entre os países, diz o economista-chefe da agência de classificação de risco.

"Nem sempre uma taxa de juros mais alta significa que há uma boa oportunidade de investimento. Às vezes, há riscos embutidos que não valem a pena", diz Agostini.

REAL DEVE SEGUIR PERDENDO FORÇA FRENTE AO EURO E AO DÓLAR

No caso do Brasil, Rugik, da Correparti, afirma que a tendência é de que, tanto o euro, como também o dólar, sigam no processo recente de fortalecimento contra o real.

Em um cenário internacional que já reserva uma série de incertezas no horizonte, com desaceleração econômica global, alta dos juros, guerra na Ucrânia, e novas restrições de mobilidade na China, a piora da percepção do mercado em relação ao risco fiscal e as dúvidas sobre a condução da política econômica a partir de 2023 devem manter o real pressionado em relação às moedas dos mercados desenvolvidos, diz o diretor da Correparti.

"O mercado local precisaria de um fato novo considerado muito positivo para que o real conseguisse reverter a tendência de baixa na qual ele vem ao longo das últimas semanas", diz Rugik.

Ele acrescenta que, com o dólar beirando o patamar de R$ 5,50 frente ao real, não se surpreenderia caso o BC (Banco Central) venha a intervir no mercado com a compra de dólares, de modo a tirar parte da pressão altista do câmbio, com o objetivo de evitar um contágio para a inflação.

Economistas avaliam que a principal consequência que um real mais fraco pode trazer para a economia brasileira é um aumento da inflação, que já vem rodando em níveis bastante elevados no país há algum tempo.

Com o dólar mais caro, os produtos que o país importa dos Estados Unidos automaticamente também sobem de preço, o que se reflete em um aumento generalizado das mercadorias negociadas no mercado brasileiro.

"O dólar alto acaba fazendo com que os Estados Unidos exporte inflação para outros países", diz Luca Mercadante, economista da Rio Bravo.

Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que a inflação medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) registrou alta de 0,67% em junho, com a inflação acumulada em 12 meses alcançando a marca de 11,89%.

Nesta quinta, o dólar oscilava em alta de 0,75% frente ao real, negociado a R$ 5,5030 para venda, no maior patamar desde janeiro deste ano.