“O que podemos é construir uma nova história”

Para ajudar o leitor a definir o melhor candidato para a Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, o CORREIO DA MANHÃ dá início a uma série de entrevistas com os principais candidatos a próxima eleição. Sendo assim, para nossa primeira entrevista conversamos com a candidata Clarissa Garotinho. Envolvida com a política desde 2008, quando foi eleita vereadora, Clarissa tem uma vasta experiência dentro da área.

Formada em jornalismo, ela ainda ocupou as cadeiras de deputada estadual e por duas vezes foi deputada federal. Atualmente ela é filiada ao Partido Republicano da Ordem Social (PROS) e traz em seu plano de governo mudanças na educação pública e novas diretrizes para a economia da cidade. Acompanhe a nossa entrevista com a candidata e tire suas próprias conclusões:

Correio da Manhã: Por que você decidiu concorrer à prefeitura da cidade?

Clarissa Garotinho: Muita gente quando eu falei que queria ser prefeita do Rio disse: “Clarisse você é doida”. Ainda mais uma cidade como o Rio de Janeiro com tantos desafios, cheio de máfia e caixas pretas para abrir, problemas orçamentários para resolver. Mas o que me move é justamente esse desafio. Quero ser essa alternativa que as pessoas não tiveram em 2016 quando elegeram o (Marcelo) Crivella. Então a minha candidatura vem contra este momento que o Rio de Janeiro vem vivendo. Acho que loucura maior é voltar com aqueles que já foram prefeitos dessa cidade esperando coisas novas. Eduardo Paes e o Crivella já tiveram a chance deles, por isso quero colocar o meu nome à disposição dos cariocas. Fui vereadora, fui deputada estadual, deputada federal por duas vezes, já fui secretária municipal e não tenho nada que desabone a minha conduta. Acho que o Rio de Janeiro pode viver um novo tempo e eu quero construir isso para nossa cidade.

CM: Você disse que tem uma vasta experiência dentro da política. Em que isso vai ajudar você dentro do seu governo?

CG: Eu ganhei experiência. Como vereadora do Rio eu tive a oportunidade de ter um debate muito importante no Legislativo, como Secretária eu tive a oportunidade de conhecer melhor a máquina, como funcionam as coisas por dentro. Com certeza essas experiências vão somar para a gestão na prefeitura. Tanto no diálogo com o parlamento, como na capacidade de administrar, pois eu conheço como as coisas funcionam.

CM: Um dos grandes problemas que a cidade vive hoje é em relação aos cofres públicos. Como você vai agir nas questões econômicas?

CG: A primeira coisa que a gente tem que fazer é recuperar a capacidade de investimento do Rio. O Eduardo Paes, quando foi prefeito, comprometeu as receitas da cidade e endividou o Rio de Janeiro, porque ele pegou uma quantidade enorme de empréstimo com juros altos. Assim perdemos toda a possibilidade de investimento. Quando o Crivella diz que a gestão dele teve dificuldades porque ele está pagando as dividas do passado do Eduardo, ele tem razão. Mas o que ele não tem razão é, de depois de quatro anos ter um governo péssimo, usando o pagamento das dívidas do passado como desculpa. Existe muita coisa que não precisa de dinheiro e sim boa gestão, competência e vontade política. Uma delas é também a conservação da cidade, ela está muito mal conservada e pra isso você não precisa de rios de dinheiro. Você precisa de vontade política de fazer acontecer. A população de rua aumentou, as ruas estão esburacadas, a cidade está mal iluminada. Então nós temos problemas que são básicos e o Crivella não teve competência para cumprir o papel de síndico da cidade. Ele tem razão quando diz que a cidade está endividada. Mas ele foi um péssimo gestor tanto na questão fiscal, quanto no dia a dia da cidade.

CM: Mas como reverter essa situação?

CG: A primeira coisa que eu quero fazer é renegociar a taxa de juros desses empréstimos feitos pelo Eduardo Paes. Hoje a prefeitura paga uma taxa média de 6,5% de juros, quando as taxas de mercado giram em torno de 2%. Nós perdemos cerca de R$ 2 bilhões só porque o Crivella não renegociou essa taxa pela metade. Então é possível fazer uma gestação fiscal mais eficiente. Temos que começar fazendo isso. Renegociar essas taxas para conseguir dar um fôlego fiscal para o Rio e dar mais capacidade de investimento.

CM: Sabemos que a segurança é um assunto que diz respeito ao Governo do Estado. Porém como você acredita que a prefeitura poderá agir para apoiar nesse assunto?

CG: Durante muitos anos os prefeitos se eximiram da responsabilidade que devem ter com a segurança. Embora você tenha algumas competências como o tráfico de drogas e armas, que são de responsabilidade federal, a administração da polícia que é estadual. Porém, as pessoas que vivem na cidade precisam se sentir seguras. Isso é importante para a vida da população, o crescimento da cidade e para os investidores. Precisamos de um ambiente de paz. Dentro da Prefeitura o que podemos fazer é iluminar as ruas, porque elas escuras são um prato cheio para a criminalidade. Precisamos revitalizar os centros dos bairros e o entorno dos trens, metrôs e BRTs, para que sejam ambientes com vida e revitalizados, que inibem a presença de criminosos. Por último, armar a guarda municipal.

CM: Armar a Guarda Municipal está dentro do seu planejamento?

CG: Eu defendo o armamento da Guarda Municipal. Começando com o grupamento ate que todo o efetivo seja armado. Claro, oferecendo treinamento especializado para Guarda, mas entendendo o papel dela dentro do Sistema Único dentro da Segurança Pública. Então quando a gente discute hoje armar a Guarda, a gente entende que ela não pode mais cumprir o papel de um agente que só vai guardar o patrimônio e que vai cuidar de posturas municipais, mas sim, que ela é fundamental para gerar uma sensação de segurança na sociedade. Mas isso não vai acontecer enquanto não armarmos e prepararmos ela para isso.

CM: Outro grande problema que a cidade possui é em relação a saúde pública. Como você pensa em lidar com isso?

CG: A saúde e o emprego são os dois maiores desafios e precisam ser o carro-chefe da próxima gestão. Temos um grande problema com as organizações sociais, mas por que isso? Quando elas foram feitas não houve rigor nem na fiscalização e nem no processo seletivo sobre quais as OSs estariam aptas para trabalhar na cidade do Rio de Janeiro. Então como o Eduardo Paes não teve rigor nesse sentindo, passaram a atuar na cidade do Rio OSs que já respondiam a diversos processos no sul do país. Isso é inadmissível. Uma OS que já respondia processos não poderia nunca ser habilitada para trabalhar no Rio, isso aconteceu. Então para isso, precisamos ter rigor no processo seletivo e na fiscalização. Não pode ter uma organização social que pague em remédios até 1.000% superfaturado do valor pago em uma compra direta. Por isso, a primeira coisa é acabar com a caixa preta das OSs e criar um processo seletivo rigoroso.

CM: Você tem a ideia de trazer o Prontuário Único do Paciente; como ele funcionária?

CG: O Prontuário Único do Paciente é uma realidade em diversas cidades da América Latina onde isso é uma realidade e isso aqui não existe. Existe uma rotatividade muito grande dos médicos nas OSs. Isso faz com que o médico não tenha o histórico do paciente e um médico sem isso leva muito mais tempo para um diagnóstico preciso. Tendo muitas vezes que repetir exames desnecessários. Então queremos integrar toda a rede municipal da saúde criando o Prontuário Único do Paciente, onde em qualquer unidade que ele seja atendido, ali vai estar o histórico possibilitando um diagnóstico mais breve e preciso.

CM: Existe algum plano de governos anteriores que você pensa em resgatar caso eleita?

CG: Retomar um programa antigo do Cesar Maia, o “Remédio em Casa”, que nunca devia ter acabado. É um programa excelente no qual, principalmente os idosos, que fazem uso de medicamentos contínuo recebiam os remédios em casa. Hoje vivemos uma crise em que as pessoas vão para os postos de saúde e não encontram o remédio que procuram. E quem faz o uso contínuo sofre com isso, mesmo porque, muitas vezes são remédios caros ou difícil de serem encontrados, mas não podem deixar de ser tomado.

CM: Um dos pontos que você quer ressaltar é o uso da tecnologia, como pensa em usar a favor da saúde, como a Telemedicina?

CG: Telemedicina é coisa do presente. Nós precisamos que o Rio de Janeiro seja uma cidade moderna e humana. Onde usamos a tecnologia a favor do cidadão. Vivemos uma crise de médicos especialistas. Uma maneira de driblar isso é usando a telemedicina. Você pode ter um clínico geral junto do paciente e um especialista do outro lado da tela orientando. O especialista por sua vez, sabe até onde ele pode ir antes de pedir exames e tudo mais. O que não pode é dizer que não vai usar essa tecnologia e simplesmente não fazer nada e a população ficar sem atendimento. Então no nosso governo, a telemedicina será uma realidade.

CM: O nosso atual prefeito vive um verdadeiro embate com alguns veículos da imprensa. Como você pretende se portar junto a imprensa?

CG: Eu entendo que as vezes é difícil para pessoa pública lidar com a imprensa. Ainda mais porque o Brasil, diferente de outros países que possuem a linha editorial muito clara, onde os jornais podem manifestar apoio público de maneira muita clara, aqui, mesmo seguindo tendo opinião própria, os veículos tendem a se vender como isentos. Então às vezes as pessoas misturam e levam isso para o jornalista que está na ponta disso tudo. O jornalista em si não é responsável pela linha editorial e deve ser tratado com respeito. Eu me formei em jornalismo e acho que todos os profissionais, inclusive os jornalistas, merecem respeito. Embora eu veja que é muito importante a gente rediscutir a concessão dos veículos de comunicação. No Brasil, uma mesma família detém a concessão de jornal, televisão e rádio. Eu acho que quanto mais plural e veículos tivermos, a gente tem mais democracia.

CM: Não tem como falar em Clarissa sem ligar você aos seus pais. Atualmente essa ligação automática é boa ou ruim para a sua carreira?

CG: A pergunta que eu faço é: “O Garotinho e a Rosinha foram governadores. De lá para cá, Crivella, Eduardo Paes, (Sérgio) Cabral, (Luiz) Pezão e (Wilson) Witzel o Rio melhorou ou piorou?”. Então não cabe a mim avaliar se é positivo ou negativo. A minha família foi vítima de muitas injustiças. Os processos que meus pais enfrentaram, que eu considero injusto, não tem nenhuma relação com nada que tivessem feitos quando governadores. Eles foram vítimas de uma violência política porque meu pai resolveu denunciar a Procuradoria Geral da República (PGR), uma grande máfia que se instalou no Rio de Janeiro. Aliás, máfia que teve braços no Executivo, com Sérgio Cabral e Pezão, e no Legislativo, com Paulo Mello e (Jorge) Picciani. Mas também tinha braços no Ministério Público, onde tivemos o chefe do ministério (Cláudio Lopes) preso, no Poder Judiciário, onde tem desembargadores denunciados. Então durante 10 anos, o Garotinho parecia um pregador no deserto. Ele anunciava os problemas e dizia o que ia acontecer. Foi o único a protocolar uma queixa-crime na PGR. Você acha que é possível fazer isso sem nenhuma represália? Mas nenhuma denúncia feita à família foi comprovada. Por isso ele foi preso e solto tantas vezes e segue solto. Além disso, se você rouba alguma coisa, essa riqueza precisa se materializar. Quando nós denunciamos o Cabral, Pezão, o Mello, o Paes, nós apontamos onde estavam as duas mansões e as contas nos exterior, as fazendas do Mello e do Picciani, as contas no exterior da família do Paes em paraíso fiscal, aberto pela Mossack Fonseca, mesma empresa que lavou dinheiro para o José Dirceu. E contra a minha família, o que tinha? Nada, a não ser uma denúncia de um uso eleitoral de um cheque-cidadão em uma eleição que nem o meu pai, nem a minha mãe e nem eu estávamos concorrendo a nada. Então está muito claro que eles foram vítimas de uma perseguição política.

CM: Então o passado deles não te incomoda?

CG: Guilherme, eu não posso mudar o passado. Eu já sofri muito por isso. Fiquei triste, sofri muito preconceito e tive muitas decepções e com as injustiças que a minha família sofreu. Eu não posso mudar o que passou, mas o que podemos é construir uma nova história. Eu não posso mudar a injustiça que a minha família viveu, assim como não podemos mudar o passado triste que o Rio viveu na era Cabral, Paes e Pezão, o que todos nós devemos fazer é construir uma nova história para nossa cidade. Para criar um Rio de Janeiro mais moderno, inteligente, justo e mais humano, reduzindo as desigualdades sociais e voltar a gerar empregos. Porque quando acabar o auxílio emergencial, o Brasil vai viver momentos muito difíceis. Muitas empresas fecharam as portas definitivamente, tem muita gente desempregada. Precisamos ter um amplo programa investindo em inovação que gere empregos qualificados e um amplo programa de cooperativa dentro das comunidades carentes para que possam trabalhar e ter renda.

CM: Para encerrarmos fale um pouco para os nossos leitores sobre o que você pensa e pretende fazer para cuidar da Educação.

CG: Essa era da pandemia criou uma distância ainda maior entre rede pública e privada. É urgente mudar o modelo educacional. Cada aluno precisa ter um tablet com acesso à internet. Isso não é caro de se fazer. Precisamos inserir esses alunos nas novas tecnologias para que no futuro estejam por dentro. Muitas profissões deixarão de existir. Então não é justo que em escolas particulares os alunos tenham acesso a inglês e robótica enquanto as crianças da rede pública mal tiveram aulas na pandemia por não terem aparelhos para ter acesso a internet. Então essa desigualdade nós precisamos diminuir e mudar o modelo educacional desde o ensino fundamental no Rio de Janeiro.