Por Cláudio Magnavita*
Eraldo Alves da Cruz deveria ter sido diplomata. Falava fluentemente línguas e pensou seriamente em encarar o Itamaraty como carreira.
Era impecável ao se vestir, sempre com bons blazers e lenço de seda no bolso superior.
Foi escalado para ser o braço direito de um tio visionário, o Eron, um sergipano, um industrial que criou a EronTex e dezenas de empresas, entre elas aquele que seria o seu cartão postal, o Hotel Eron em Brasília, o primeiro de alto luxo e a ter um elevador panorâmico. Era um outro Brasil, na década de 70, Brasília respirava um clima de cordialidade que até hoje nos deixa saudade.
O Eron era o palco de reuniões inacreditáveis para os dias de hoje. Oposicionistas se confraternizavam no bar do último andar. Desafetos no plenário, bebiam e riam cordialmente para espantos daqueles que não estavam acostumados com o teatro do poder.
Neste cenário, Eraldo virou o diplomata que sempre quis. Brasília e as amizades que fazia, o colocavam no coração do poder e com uma agenda de telefones preciosos. Um caderninho de dar inveja.
Tudo se resolvia com um telefonema. Não havia ainda a banalidade do celular.
Na sua sala no hotel, ele cultivava um hábito: Colecionar a secção diária do Correio Braziliense com fotos de ângulos inusitados de Brasília. Ele amava a cidade e era o seu príncipe.
Foi um período dourado, de agenda social intensa, de churrascos ao fim de semana, de ver os filhos chegarem e cada vez mais próximo do tio.
Era o homem conhecido por todos e a todos conhecia. Tinha o dom de saber ouvir e de fazer seus interlocutores se sentirem como os mais importantes do mundo. Era um anfitrião nato.
Nasceu para ser hoteleiro.
Tinha também o hábito de fotografar detalhes dos hotéis em que se hospedava. A sua mente vivida vibrava quando era surpreendido. As originais que via, trazia para o Eron.
Foi uma época de bases sólidas, sem maiores preocupações e com muita saúde.
É deste Eraldo que quero guardar a lembrança.
Tudo que passou e principalmente o calvário que viveu heroicamente, enfrentando uma doença, muitas vezes derrotada insistia em retornar. Lutou a batalha final que não apagou a imagem do diplomata, do príncipe de Brasília e do anfitrião maior da capital do país.
A vida é feita por ciclos e neste período de bonança que ele viveu nos anos 70 e 80, aprendeu a conviver com a intimidade do poder, já era o ápice de uma passagem sem dor e sem problemas. Ali ele fazia a sua história.
A dor o levou para um lado de espiritualidade extrema. Acreditou como nunca no divino e da magia de perdoar e principalmente ser perdoado.
Foi o homem dos detalhes e das entrelinhas. Inteligência privilegiada que compreendia o
todo e também os pequenos nuances.
Foi uma pessoa que compreendia o código dos gestos. Viveu com o simbolismo do poder a melhor parte da sua juventude.
Encontrou na reta final seu porto-seguro e saiu de cena, não por coincidência, mas por destino, exatamente no dia mundial do turismo, atividade do qual se transformou em um dos protagonistas.
Descanse em paz Eraldo! A sua luta e martírio o transformou, na fase final, no diplomata da plenitude.
*Claudio Magnavita é membro do Conselho Nacional de Turismo