Ampliar o debate sobre a privatização da Cedae

Por Ricardo Bruno*

Pergunta que não quer calar: Por que razão os defensores do liberalismo econômico que se juntaram ao capital internacional para peremptória defesa da privatização da Cedae não o fazem também nos estados de São Paulo, com a Sabesp, e de Minas Gerais, com a Copasa?

Afinal, os governadores João Dória (PSDB) e Romeu Zema (Novo) são dois dos mais ferrenhos adeptos do liberalismo econômico. Propugnam com entusiasmo as teses do livre mercado e, em princípio, abominam a intervenção do estado na economia. Grosso modo, podem ser definidos como os mais autênticos discípulos do receituário liberal de Adam Smith na administração pública brasileira.

Nem, por isto, Dória e Zuma parecem propensos a entregar as duas empresas públicas ao mercado em condições desvantajosas à sociedade como está ocorrendo no Estado do Rio, num movimento orquestrado por grupos financeiros internacionais, com participação de setores da imprensa, especialmente dos veículos de comunicação das Organizações Globo.

Ao contrário do Rio, onde discutir aspectos polêmicos do edital soa praticamente como um sacrilégio aos olhos do mercado, em São Paulo e em Minas a privatização das estatais de saneamento sequer entrou em pauta. E não se verifica qualquer tipo de frustração dos agentes econômicos, que lá não manifestam cobranças impertinentes em favor de um leilão às pressas - não precedido uma amplo debate na sociedade e no parlamento - como fazem aqui.

É inadmissível não incluir a Assembleia Legislativa no debate sobre a modelagem que irá resultar na concessão. Trata-se de uma falha política que deslegitima o processo. Afinal, é no parlamento que se promove o confronto de ideias e posições que irá produzir o consenso, em torno do qual crescem as chances de acerto.

Se a Cedae é atraente ao mercado, a SABESP também certamente o é. A empresa de saneamento fluminense apresentou, em 2019, lucro de R$ 1,02 bilhão. A estatal paulista chegou a um resultado de R$ 3,3 bilhões. Não há argumento lógico para se construir um discurso único em defesa da concessão da CEDAE, apartado de um amplo debate nacional sobre a oportunidade de se ampliar o movimento para os dois outros maiores estados da federação.

A exclusividade da pressão sobre Governo do Rio para conceder a Cedae de afogadilho revela, por baixo, um estranho casuísmo. Que deve ser aclarado através da realização de debates e audiências públicas, num movimento tão trabalhoso quanto inevitável. A democracia é sim trabalhosa. Não há como fugir deste princípio.

De resto, somente o debate fará eventualmente a concessão da Cedae ser compreendida e apoiada pela sociedade.

*Jornalista