Engenhando a Cidade: voluntariado de estudantes de Engenharia da Escola Politécnica da UFRJ

Por Francisco Victer, Severino Virgínio e Yan Monteiro*

As ações de voluntariado, como o nome sugere, consistem em ações organizadas de forma espontânea, realizadas por parte de cidadãos que visam melhorias para a sociedade. Embora não sejam remunerados financeiramente, os voluntários desenvolvem uma nova visão de cidadania que resulta em uma expansão dos horizontes acerca da área de atuação, em um fenômeno que é especialmente perceptível nas engenharias. Desse modo, nasce daí uma relação ganha-ganha entre as partes, consolidando uma perspectiva de cidadania, cada vez mais atuante. A demanda por esse tipo de atividade é ressaltada em planos de ação institucionais, como demonstrado recentemente no Plano de Desenvolvimento Sustentável e Ação Climática (PDS) do Rio de Janeiro da cidade do Rio Janeiro, o qual inclui em sua ação 17: “[...]triplicar o número ações de voluntariado voltadas à proteção, conservação e recuperação de equipamentos naturais e culturais da cidade”.


Nesse contexto, surgiu o “Engenhando a Cidade”, um projeto de voluntariado criado em 2019 por três estudantes da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ao idealizar o projeto, os estudantes Francisco Victer, Severino Virgínio e Yan Monteiro, almejam contribuir de forma efetiva com políticas públicas alinhadas com demandas não só da população, em geral, como também de entidades da sociedade civil. Desse modo, a organização foi fundada, explorando como principal recurso a elaboração de memoriais descritivos que abordam de forma técnica os problemas relativos aos espaços públicos, propondo soluções viáveis.

A partir desta perspectiva, o compromisso do projeto voluntário é colaborar com o poder público, tomando a iniciativa para identificar e detalhar quais as demandas populares factíveis para intervenções e, posteriormente, encaminhá-las aos órgãos públicos competentes. Ou seja, temos como objetivo “reconstruir” os espaços de forma contínua, de acordo com boas práticas das políticas públicas, “engenhando a cidade”, como propõe o nome do projeto. Não por acaso, nosso portfólio conta, atualmente, com 3 projetos especiais que estão perfeitamente alinhados com as principais premissas: Parque Marcello de Ipanema (em que buscamos revitalizar um espaço de lazer), comunidades da Praia da Rosa e Sapucaia (no qual revertemos nosso conhecimento em prol dos mais pobres) e o retorno da Estrada do Galeão (tratando um problema crônico).

Objeto de nosso primeiro memorial, o Parque Marcello de Ipanema trata-se de um parque municipal dedicado ao lazer, estrategicamente posicionado em uma região próxima à capela imperial, praça e iate clube no bairro do Jardim Guanabara. Embora possuísse, além de localização privilegiada, uma vista exuberante, o local encontrava-se abandonado e subaproveitado. Desse modo, identificamos os principais problemas da região, realizamos sugestões de melhorias e encaminhamos-as a alguns vereadores do Rio de Janeiro, vislumbrando possíveis usos que tornassem o local mais atrativo sob os aspectos turístico, econômico e cultural a partir de pequenas intervenções. Surpreendendo-nos de forma positiva, o vereador César Maia, que havia inaugurado o parque como prefeito há mais de duas décadas, efetuou uma indicação legislativa, utilizando como insumo o memorial elaborado pelo Engenhando.

Para atender à missão de retribuir concretamente à sociedade pelo ensino público de qualidade proporcionado, tivemos a oportunidade de sugerir intervenções nas comunidades da Praia da Rosa e de Sapucaia, a partir de contato com os reais demandantes, em visita técnica guiada pela Associação de Mulheres da Ilha do Governador. Este trabalho, aliás, foi objeto de artigo premiado pelo Instituto de Engenharia e Arquitetura do Estado do Rio de Janeiro (IEEA-RJ), tendo sido publicado na edição especial de 30 anos da revista do órgão. Com base nas informações colhidas na visita técnica e sob a orientação do Engenheiro Wagner Victer, elaboramos o memorial descritivo e o encaminhamos para as entidades públicas competentes, como COMLURB, INEA, SEINFRA e SEAPPA. Os órgãos públicos atenderam o pleito, e a população local foi beneficiada, com duas intervenções cruciais: a reforma e melhoria da ponte que liga as comunidades e a limpeza com dragagem da saída pluvial que passa sob a ponte.

Por fim, o memorial descritivo do Retorno da Estrada do Galeão trata de uma problemática tão trágica quanto recorrente na Ilha do Governador: a elevada quantidade de acidentes automobilísticos no retorno na altura da Base Área, no sentido da Ilha do Governador. Nele foi proposta a ampliação da pista de aceleração existente, tratando-se, portanto, de uma implementação relativamente simples e que poderia utilizar o espaço disponível na região. A proposta foi bem recebida pelos órgãos públicos, dentre os quais gostaríamos de destacar o Comando Geral do Corpo de Bombeiros, que também reconheceu a alta frequência de acidentes no ponto.

Desse modo, percebemos que o trabalho voluntário é enriquecedor na formação de um estudante de engenharia, contribuindo para a sua não alienação sobre o que ocorre no entorno, desenvolvendo uma visão mais crítica, ao mesmo tempo que esse discente traz um retorno social à sua comunidade. Afinal, ter contato com uma diversidade de agentes e elaborar soluções para problemas de diversas naturezas encontrados no dia-dia é uma etapa fundamental na formação de um engenheiro. Embora dentro da universidade tenhamos colaborado na elaboração de projetos, seja em competições, empresas juniores e iniciações científicas, foi no projeto “Engenhando a Cidade” que tivemos a oportunidade de contribuir com a sociedade, retornando o investimento em nós realizados pela universidade pública.

Assim, nota-se que a ação voluntária possui um grande potencial e espaço para inserir estudantes de engenharia como agentes modificadores do meio físico e social. As universidades públicas, que muito contribuem com diretrizes de políticas públicas, podem potencializar e estimular essa prática entre os alunos. A qual, além de ser fundamental para o desenvolvimento do aluno, gera um retorno direto para sociedade e melhora a comunicação entre as instituições. Acima de tudo, vale ressaltar a importância da comunidade civil, que colabora durante o diagnóstico dos problemas enfrentados e através do canal das mídias sociais é fundamental para dar tração aos projetos. Desse modo, percebe-se que o resultado gerado não é consequência somente de um agente ou parte engajada, mas de um ecossistema que responde aos estímulos e críticas, e permite que resultados concretos sejam construídos.

*Francisco Victer - Aluno de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da UFRJ - Coordenador Executivo do projeto “Engenhando a Cidade

Severino Virgínio - Aluno de Engenharia Naval e Oceânica da Escola Politécnica da UFRJ - Coordenador de Comunicação do projeto “Engenhando a Cidade”

Yan Monteiro - Aluno de Engenharia Civil da Escola Politécnica da UFRJ - Coordenador de projetos do “Engenhando a Cidade”