O sabonete Phebo foi assassinado?

Por Wagner Victer*

As questões sensoriais nos levam muitas vezes a recordar passagens da nossa vida que nos remetem ao passado, em especial a momentos da nossa vida que são marcantes e felizes.

Na célebre animação “Ratatouille”, o carrancudo crítico de cozinha francesa, Anton Ego, se deixa levar pelos aromas e sabores de um prato simples que é o Ratatouille, pois o prato o remete ao passado e ao contato com sua mãe e esse prato fez com que o pequeno restaurante comandado pelo Chef Linguini, com o apoio do ratinho Remy, pudesse ser premiado.

Na certa, muitos de nós temos nossas lembranças de vida por sabores e até tentamos de alguma forma passar para as próximas gerações. Foi o que aconteceu na minha vida com o sabonete Phebo odor de rosas, que é aquele de cor preta, com um aroma diferente de um perfume bem próprio e que vem naquela embalagem de cor amarela com a parte frontal vermelha e com letras mescladas entre branco e preto, que não me lembro quando, mas me foi apresentado por minha mãe, Dona Leda, quando eu ainda era criança.

Era algo maravilhoso, que se orgulhava de existir desde 1930 com um aroma fantástico, e usá-lo era como se estivéssemos tomando um banho com um perfume especial. Durante décadas sempre usei como algo que me remetia ao passado. Quando morei no exterior me lembro que levei um estoque grande de sabonete e a cada banho que tomava na longínqua Cidade de Cambridge, em Massachusetts, o cheirinho me remetia à minha infância e estabelecia laços de lembranças com meu país e minha família.

Recordo-me também que estudava comigo a Presidente da Procter and Gamble do Egito, e que comentei que aquele sabonete era produzido somente no Brasil por uma empresa controlada pela Procter and Gamble (Perfumaria Phebo) e dei um pra ela um sabonete. Ela ficou encantada e maravilhada com aquele sabonete e fazia eu ligar para minha Secretária que, via Courier, tinha que enviar pacotes do sabonete. À época, ela se comprometeu a buscar algo semelhante no Egito onde ela era Executiva.

Há cerca de dois meses fui comprar o sabonete Phebo, que desde 2004 pertence ao Grupo Granado, um grupo tradicional de farmacêutica fundado em no Rio de janeiro em 1870, e quando fui tomar banho não senti a fragrância tradicional, muito pelo contrário, até um cheiro muito diferente, uma consistência meio betuminosa, e a própria cor do sabonete estava totalmente diferente do que me acostumei no passado e fazendo muito menos espuma. Ou seja, mais do que um rompimento de um produto tradicional, senti uma frustração tremenda no consumo.

Por ser uma pessoa persistente, naquele mesmo momento tirei uma foto do lote onde estava a embalagem e mandei para o sistema de atendimento ao cliente da Granado relatando o ocorrido, o que, aliás, já fiz dezenas de vezes, não só por WhatsApp, que, aliás, respondem de forma burocrática com uma mera resposta automática, e também por e-mail, que sequer se dignaram, mesmo que prometido e marcado duas vezes, a recolher o sabonete para verificar o que houve. Ou seja, um total desrespeito com o consumidor e com a própria marca, já que, ao não recolher um produto alertado por um consumidor que está supostamente em desacordo com a qualidade original do produto, demonstrando um desprezo com o histórico dessa marca.

Para mim fica nítido, em impressão e sentimento, que a atual controladora do sabonete Phebo, que é a Granado, descaracterizou a histórica fórmula desse produto, e logicamente isso viola o próprio Código de Defesa do Consumidor, pois atropelo os direitos do consumidor em ter conhecimento das modificações de fórmula., conforme dispõe o artigo 6º, que afirma em seu inciso III que “são direitos básicos do consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”.

Tal fato pode ser um mero erro no processo produtivo ou até uma mudança de fórmula, e tenho insistido para que eles retirem as amostras, até para dar uma satisfação, não só a mim, mas à minha história e ao meu passado, e acredito que também a muitos que estão sentindo a mesma coisa, que é algo lamentável e um desrespeito ao consumidor. Na realidade, o sistema de atendimento ao consumidor, SAC, da Granado demonstra que a qualidade é algo que eles infelizmente não estão prezando, o que é preocupante e pode eventualmente se repetir na padronização dos seus produtos.

A pergunta que faço é: será qe assassinaram o sabonete Phebo? Não sei se por mera incompetência, leniência no relacionamento com o consumidor, ou até eventual economia de custos, mas essa reposta não me é dada e acaba virando um grande segredo e principalmente um desrespeito ao consumidor e ao produto que era uma das marcas nacionais que certamente só existia aqui.

O fabricante tem todo direito de mudar a especificação do seu produto, mas tem a obrigação de deixar isso claro e esclarecer o que está havendo, já que o direito à informação está diretamente ligado ao poder de escolha do consumidor. Essa é a expectativa que tenho, pois assassinar o sabonete Phebo é a mesma coisa que tornar o nosso querido Catupiry tipo um queijo “Philadelfia”, ou seja, sem aquela consistência tradicional que nós consumidores brasileiros conhecemos bem.

Os sabonetes Phebo não são apenas simples sabonetes, mas sim uma viagem ao passado, que nos faz recordar de pessoas e momentos inesquecíveis. É uma preciosidade brasileira e com valor imaterial que merecia até ser tombado e a Empresa Granado tem o dever de preservar esse patrimônio presente na vida e na história de muitas pessoas.

*Engenheiro, Administrador e Jornalista