EDITORIAL | “O lucro da Petrobras é um estupro”

“O lucro da Petrobras é um estupro” 

A frase do título deste editorial é do Presidente Jair Bolsonaro. A roubalheira dos tempos vermelhos instalou em toda discussão sobre a Petrobras uma lógica perversa e errada: toda vez que alguém (e.g. Bolsonaro) fala da falta de sensibilidade da empresa controlada pelo Estado Brasileiro para a questão inflacionária e o caos mundial, surge a acusação: Intervencionista! Antiliberal! Lulo-petista!

Será que é isso ou se quer, propositalmente, descortinar o caráter abusivo da situação. Vejamos:

Em primeiro lugar, apenas como contexto, basta olhar os presidentes da Petrobras no Governo Bolsonaro e a administração da empresa para se ter certeza de que o Governo Federal segue um verdadeiro mantra em favor da boa administração, sem favorecimentos. Ou seja, gosta-se muito de especular sobre o que quer ou não o Presidente no seu íntimo, mas de intervencionismo não se trata, pois a verdade é que a sua caneta Bic nunca colocou um “companheiro” no comando da maior empresa Brasileira.

Em segundo lugar, não se pode perder de vista que se uma grande empresa, 100% privada, com 80% a 100% do market share em um determinado mercado, sobe constantemente seus preços e empurra diretamente a inflação para cima, cria-se um clamor na imprensa e nos seus clientes, com todo o tipo de pressão, o que, via de regra, dá causa a uma medida sensata por parte dos dirigentes daquela empresa, qual seja, flexibilizar seus ganhos, reduzir as suas margens por algum tempo, contribuindo para o bom funcionamento do mercado e ao bem-estar da sociedade. Afinal, a empresa é monopolista e de nada adianta esganar o mercado agora, gerando caos e paralisação amanhã (e.g. Greve de Caminhoneiros e parada da atividade econômica).

Exemplos não faltam. Para ficar em um mais imediato, quisesse a Pfizer, Janssen e outros, no auge da pandemia, cobrar o triplo do preço pela sua vacina, como se sabe, sem concorrentes no curto prazo, por certo a sociedade teria que pagar por elas, não? Não o fez.

E isso ocorre menos por bom coração do capitalista e mais por razões muito claras e respaldadas pelo Direito e pela Experiência.

De um lado, juridicamente, diz o artigo 170 da CF, que são princípios da Ordem Econômica, dentre outros, a “função social da propriedade”, "a livre concorrência” e a “defesa do consumidor”. Se um monopolista, sobretudo em tempos de explosão do preço do barril do petróleo por conta de Guerra, mantém suas margens no talo, por certo, não cumpre a “função social da propriedade”, a “livre concorrência” e a “defesa do consumidor”. Em bom linguajar econômico-liberal, abusa de sua posição dominante, em clara transgressão à lei concorrencial pátria (lei 12.529/2011). Talvez não por acaso na atualidade existam notícias recentes de que o CADE (comandado pelo “menino do Ciro”) já recebeu diversas queixas da ANP sobre o comportamento abusivo da Petrobras (v. coluna política do Estadão de hoje). Falta ao Estado, talvez, agir... e aqui, dentro das quatro linhas, como aconteceria com qualquer agente privado abusivo. Por que com a Petrobras é diferente? Por que qualquer crítica à sua atuação mercadológica, na condição de monopolista, é sinal de intervencionismo? Quer dizer que a Petrobras não erra? Não abusa? Infalibilidade papal?

Do outro, em termos de experiência, é muito natural que, em momentos de crise, o Governo abra mão de arrecadação e ganhos para gerar bem-estar social direto. Veja que ontem, a equipe do Min Paulo Guedes, canetou a derrubada da alíquota de importação do aço tipo vergalhão, atendendo à reclamação do setor de construção civil. Com isso, abriu mão do imposto de importação (imposto) e escancarou nosso mercado para a enorme quantidade de aço chinês que bate às nossas portas. Gritaria dos agentes econômicos prejudicados não falta, mas ninguém ousa dizer que o Governo está agindo fora do seu dever e possibilidades, fomentando empregos e a atividade econômica.

É preciso, portanto, sensibilidade dos agentes políticos – em todos os níveis – para agir. Mais de 30% do preço do combustível é feito de ICMS. Os estados, é notório, batem, mensalmente, recordes de arrecadação, na medida em que calculam o ICMS pelo preço pauta, que é usualmente o mais elevado do mercado. Não adianta agir como aquele punguista que bate a carteira do passante e grita “pega ladrão”! Quer contribuir para diminuir o custo energético do país, precisam os governadores sair da toca, com responsabilidade e comprometido com o Brasil.

Em resumo, o exorbitante lucro da Petrobras é sim um estupro, no sentido criminoso mesmo. Sem mãos a medir, a empresa se aproveita de seu caráter monopolista para garantir margens confortáveis e lucros fantásticos, sem ser incomodada por ninguém. Pois, afinal, se alguém ousar criticar os lucros da Petrobras torna-se de imediato símbolo ou do intervencionismo, ou da volta aos tempos lulo-petistas. Com certeza, entre uma coisa e outra, há a possibilidade de aplicação do bom direito, da boa administração pública e, ainda, da necessária sensibilidade política daqueles (governadores) que tanto arrecadam com o combustível. Com a palavra, o CADE, o Ministério da Economia, o Congresso e os governadores.